31 março 2008

My Favorites # 8 - Moondog Jr. - “Everyday I Wear A Greasy Black Feather On My Hat” (1995 Island)

Apesar de ainda pertencer aos dEUS na altura da edição deste disco, Stef Kamil Carlens já tinha tido as suas experiências nos Kiss My Jazz, e parecia querer definitivamente afastar-se do rumo que Tom Barman pretendia para os dEUS. E essencialmente queria poder gravar as suas composições, e não perder tempo a “lutar” com as composições dos outros membros dos DEUS.
Com a colaboração de vários músicos conhecidos da enérgica cidade de Antuérpia, criou um projecto que iria abordar um som mais “americano”, pois as influências da cultura e música americana são evidentes. O facto do disco ter sido co-produzido pelo competente Michael Blair, conhecido pelo seu trabalho com Tom Waits, e as evidentes semelhanças com o trabalho deste último, aqui presentes, reforçam esse facto (“Cachita” é um excelente exemplo).
O disco é extremamente rico ao nível musical, com variadas fontes: “rock”, “blues”, “country”, “jazz”; que interligadas dão origem a um som original.
As canções como é apanágio em Carlens são extremamente emocionais, intensas, melancólicas.
Destaco algumas das minhas favoritas: “Jintro & The Great Luna”, “Shall I Let This Good Man In” ou “The Ricochet”.
Após a edição do disco teriam problemas legais por causa do nome Moondog, e iriam altera-lo para Zita Swoon. O culto, esse continuaria.

27 março 2008

The Kills – “Midnight Boom” (2008 Domino)

Ao terceiro disco os The Kills continuam a sua visão única de como deve ser o “rock”: tenso, minimal e excitante.
E se pudéssemos pensar que com a contribuição do produtor dos Spank Rock, Armani XXXchange (vulgo Alex Epton), iria existir uma radical mudança sonora, foi puro engano, pois ainda despojaram o seu som para uma forma ainda mais rude e áspera. É certo que existe um ar de modernidade e experimentação, ouçam o alegremente destrutivo “M.E.X.I.C.O.I.C.U.” ou o persistente “Sour Cherry”. E é obvio que também melhoraram os arranjos, mesmo quando só temos bateria, baixo e a disseminada voz, que combinam na perfeição, como no hipnótico “Getting Down”. Ou no delicado momento acústico de “Goodnight Bad Morning”.
Um disco sensual, onde a química e a mística existente entre o duo, não se alterou nem um pouco, e que poderá não alterar a opinião que muitas pessoas têm sobre os mesmos, pois eles não procuram alterar os princípios que firmemente seguem desde o início. Mas certamente poderá ultrapassar os anteriores, pois para quem foi seduzido pelo seu intoxicante charme no passado, é melhor que esteja preparado para se entregarem novamente.

24 março 2008

Drive-By Truckers – “Brighter Than Creation’s Dark” (2008 New West)

Podemos afirmar que “Brighter Than Creation’s Dark”, o seu sétimo disco, inclui algumas das melhores canções dos talentosos Drive-By Truckers.
A saída do guitarrista e compositor Jason Isbell da banda não se notou, pois foi bem compensada pelas composições adicionadas por Shonna Tucker (inclui a impressionante bela “The Purgatory Line”), (e pela integração do veterano Spooner Oldham), que aqui se junta aos principais compositores, Patterson Hood e Mike Cooley, e que mantendo-se em territórios que já nos são familiares, nos relatam histórias únicas como o retrato da desagregação familiar em “Daddy Needs A Drink”, a preocupação da mãe e da mulher que aguarda pelo regresso do seu homem da guerra, em “Goode’s Field Road”. Mas também nos surpreendendo com a divertida crónica de um individuo muito singular em “Bob”.
“Two Daughters and a Beautiful Wife”, “The Righteous Path” e “That Man I Shot”, são absolutamente extraordinários, relatam as negras histórias ocorridas nas pequenas cidades do Sul dos Estados Unidos. E tudo isto transcende para a música, pois tudo aqui soa tão sumptuoso e exuberante.
Um extensivo disco que contem tudo aquilo a que nos habituamos a gostar nos Drive-By Truckers.

13 março 2008

Ebay # 2 - Echospace – “The Coldest Season” (2007 Modern Love)

Este disco é um facilitador, pois reúne quatro 12 polegadas lançados em 2007 por este projecto, que é uma colaboração entre Rod Modell dos Deepchord e Steve Hitchell dos Soultek, que aqui criaram um disco de “ambient dub-techno” reminiscente do som da Basic Channel dos anos 90.
Utilizando uma variedade de equipamentos analógicos, criaram uma atmosfera musical única, um som verdadeiramente autêntico e esplendoroso.
Não sendo um disco muito experimental ou diversificado, pois nunca foge muito do género pretendido, é no entanto extremamente coeso, pois não existe nenhum momento de menor inspiração.
O tema de abertura, “First Point Of Aries”, é um dos melhores do disco, e um perfeito exemplo do som produzido. Começa com um som sibilante contínuo até que uma dissimulada linha de baixo e uma cintilante melodia surgem introduzindo uma enorme e poderosa batida.
Os restantes temas apresentam igualmente magníficas texturas sonoras, que convidam a uma “degustação” contínua desta visionária aventura.
É completamente envolvente, e sem dúvidas um disco indispensável para fãs de música electrónica ambiental.
£1.85

10 março 2008

Classic # 13 - Pavement – “Slanted and Enchanted” (1992 Matador)

O som “lo-fi” impreciso dos Pavement tornou-se numa identidade “indie”, e foi roubado por praticamente todas as bandas que se formaram na sequência de “Slanted and Enchanted”.
Quando este disco surgiu, era inovador e revolucionário, restabeleceu o “indie-rock” numa altura em que grupos como os Nirvana estavam a levar um som mais “limpo” e homogeneizado às massas. Pelo contrário, o som de “Slanted and Enchanted” é “sujo” e “gasto”.
Infalivelmente outras bandas já tinham praticado o “basement rock” antes dos Pavement, mas ninguém antes deles tinha conseguido transformar uma graduação universitária e uma vasta colecção de discos numa estética e mitologia pessoal.
Não seguiam as fórmulas “rock” “standard”, deixavam as guitarras fazer o que queriam, as letras são intencionalmente absurdas e as vocalizações são casuais, muitas vezes desconexas, algumas vezes cantadas outras simplesmente faladas.
A paixão de Stephen Malkmus por trocadilhos (“Zurich Is Stained”, “Fame Throwa”), combinado com um grande sentido de afinação, expressão e melodia, fizeram dele um dos mais interessantes vocalistas do “indie-rock”.
Canções como “Trigger Cut, “Summer Babe”, “Two States” ou “In The Mouth a Desert” são arrebatadoras ao máximo, do tipo de não nos saírem da cabeça o dia todo, e não conseguirmos parar de sussurrar.
No fundo, “Slanted and Enchanted” é um produto do seu tempo – o som de um grupo de miúdos irreverentes que queriam divertir-se e fazer música. Nunca pretendeu ser um clássico.

06 março 2008

Atlas Sound - “Let the Blind Lead Those Who Can See But Cannot Feel” (2008 Kranky)

Um projecto paralelo do prolífero e provocativo Bradford Cox dos Deerhunter, que tenta afasta-se do “noise-rock” claustrofóbico que caracteriza a sua banda. Recolhido em sua casa, criou no seu portátil, uma junção entre electrónica ambiental e melodias”pop”, que resultam numa complexa combinação de sons (na sua maioria inclassificáveis e intrigantes), que tentam retratar os pequenos dramas emocionais da adolescência que carrega.
O disco começa excelentemente com “A Ghost Story” com o “sampler” da criança a narrar uma história assustadora, e se o álbum parece querer continuar nesse território sombrio em faixas como “Cold As Ice” ou “Small Horror”, dando a impressão de se tratar de um disco capaz de assustar e paralisar o ouvinte, não é disso que se trata.
Neste diversificado disco temos composições abstractas como a agitada “On Guard” ou “Winter Vacation” (com a camuflada batida “techno”), e “indie-rock” (mas reinventado) em “Quarantined” ou no exuberante “River Card” (é incrível a percussão). No hipnótico “Recent Bedroom” relembram os My Bloody Valentine, com as suas guitarras “noise”.
O disco inclui ainda “Scraping Past” que contém um inteligente encadeamento da maravilhosamente controlada voz de Cox, com uma saltitante linha de baixo, e que resulta numa bela experiência transversal.
Este disco, que provavelmente suplementa tudo o que Cox criou anteriormente, é sombrio, melancólico e calmante, no entanto completamente reconfortante

Atlas Sound - River Card

05 março 2008

Singles # 13 - Bauhaus - “Bela Lugosi’s Dead” (1979 Small Wonder)

Diz-se que esta canção marcou o início e definiu as elaboradas fantasias cimérias do rock gótico.
Gravado na pequena editora Small Wonder, o primeiro single da banda originária de Northampton, é uma dedicatória ao ícone actor de série B, Bela Lugosi, que se tornaria conhecia pela sua interpretação no filme “Dracula”, realizado em 1931 por Tod Browning, provavelmente ainda hoje o melhor.
Eram dez minutos que criavam uma atmosfera de tensão, resultantes da combinação da voz “cavernosa” de Peter Murphy, apoiada no baixo de David J, na bateria repetitiva de Kevin Haskins e nos sons minimalistas criados pela guitarra de Daniel Ash.
E a canção termina de uma forma magistral com Murphy repetindo “Undead, Undead, Undead…” que parece evocar e reforçar a eternidade dos mitos de Dracula e Lugosi.
Em 1983, a aparição dos Bauhaus no início do filme “The Hunger” de Tony Scott, com David Bowie e Catherine Deneuve, é um prelúdio absolutamente propício para o ambiente soturno que caracteriza a discoteca onde decorre essa primeira cena. E com Murphy a demonstrar porque era (é) um dos melhores “performers” musicais, na forma como interage com a câmara.
A seguir veio “In The Flat Field”.
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Video

03 março 2008

My Favorites # 7 - The Afghan Whigs - “Gentlemen” (1993 Sub Pop/Elektra)

“Gentlemen”, para além de provavelmente ser o ponto mais alto da carreira dos The Afghan Whigs, é portador de uma dúbia distinção: é sem dúvidas o disco mais negro dos anos 90.
Greg Dulli e os seus rapazes, gravaram um disco impecável: um pesaroso, vingativo holocausto romântico, que audaciosamente infunde todas as cruas emoções da música “soul” dos anos 60, com as tumultosas guitarras do rock moderno.
Mas só um testamento assim tão corajoso e verdadeiro, poderia pronunciar com clareza toda a perturbação emocional presente nestas canções, impressionantemente belas como a sublime e penosa “Be Sweet”.
Como outras favoritas temos “Debonair”, e o papel disfuncional que ocupamos nas nossa relações, “What Jail Is Like” uma poderosa descrição do que é estar preso entre culpa e prazer visceral, e esse hino ao desejo e ao vício que é “Fountain and Fairfax”.
“Gentlemen” é um mapa misterioso para os caminhos baldios dos corações despedaçados. – e sangra brilhantemente.