28 março 2009

Howling Bells – “Radio Wars” (2009 Independiente)

Este segundo disco do quarteto de Sydney, é uma grande evolução do seu disco de estreia, retendo e remexendo na fórmula que tornou esse disco tão hipnótico e excitante - o delicado balanço entre luz e escuridão - mas incorporando uma maior variedade de sons e estilos. É uma progressão natural do disco de estreia, que agradará aos fãs do disco de estreia e alcançara uma nova audiência. A intenção de mudar é evidente, notando-se uma maior engrenagem na produção e foi visivelmente acrescentada uma camada de brilho, mas a atmosfera de maquinação mantém-se.
Assentes nas distintamente assombrosas e idiossincráticas vocalizações de Juanita Stein (o seu lirismo desenvolveu-se desde o primeiro disco), as composições revelam configurações que seduzem o ouvinte numa calma submissão, pois Juanita exala vida em cada canção, dando-lhes profundidade, significado e beleza.
O resultado final são canções assustadoramente e ameaçadoras deslumbrantes, e verdadeiramente únicas. Começando na cuidadosa e estranguladora “Treasure Hunt”, passando pela hipnotizante e pensativa “Cities Burning Down”, pela apaixonada magnificência de “Nightingale” (simultaneamente taciturna e sedutora), pela brilhante melancolia de “Let’s Be Kids”, até chegarmos ao épico e altaneiro turbilhão de “pop” cinemático presente em “Into The Chaos” e ao notável clímax final no verdadeiro sofrimento da sincera “How Long” (com uma extraordinária e apaixonada vocalização que invoca Hope Sandoval dos Mazzy Star ).
Um disco esplêndido, uma viagem através de inumeráveis e divergentes emoções que nos estimulam e electrizam.
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18 março 2009

Rock # 6 - Dinosaur Jr.- “You’re Living All Over Me” (1987 SST) / “Bug” (1988 SST)

Apesar de nunca terem tido a importância histórica de uns Pixies ou Sonic Youth, ou mesmo de uns Hüsker Dü ou Big Black, foi por aqui, via The Stooges e o “punk-hardcore” que se começou a desenvolver o caminho que iria levar aos Nirvana. É aqui que encontramos as raízes do grunge e do “lo-fi”.
O trio de Amherst composto por J. Mascis, Lou Barlow e Murph, foram uma explosão de energia, resultado da acção combinada entre a vitalidade e a tensão da química interna produzida pelo grupo liderada por J Mascis, um proto-Cobain que escreveu importantes capítulos na história da guitarra eléctrica. Ousadamente tornaram OK criarem “jams” e aplicarem extensos solos no essencialmente leal movimento “punk-indie”, totalmente desprovido de qualquer enfeite musical.
No inigualável “You’re Living All Over Me”, as canções são concisas e sinceras, onde os dotes e a presença de Mascis são colossais, pela intensidade emocional que coloca nos seus solos de guitarra, complementado por um grande trabalho de Barlow no baixo, uma mistura de melodia e distorção.
Brilhante desde o distinto e contagiantemente louco “feedback” de “Little Fury Things”, passando pela segura “The Lung”, pelo agradável “noise” de “Tarpit”, pela forma como as pesadas guitarras de “Raisans” e a insana “Sludgefeast” envenenam o ouvinte com o seu poder, até chegarmos a “Lose” e à assombrosa “Poledo”, ambas escritas por Barlow (cujas sonoridade relembram mais as desenvolvidas posteriormente no seu trabalho com os Sebadoh).
Em “Bug” o som está mais ordenado e estruturado, mas a banda estava prestes a explodir em conflitos internos. No entanto as acções combinadas mantêm-se num nível elevadíssimo, onde a dinâmica “soft/hard” é um padrão que iguala a atitude de Mascis, que alterna entre delicadeza e desejo e um mortal desencantamento, bem reflectida no ocioso e suavemente distorcido “garage.rock” de “Freak Scene” (a “marca registada” era resmungar vagarosamente vocalizações “folk” e rápidos, ásperos “riffs” e depois derramar ardentes solos de guitarra). Destacam-se ainda o dilacerantemente belo solo de “No Bones”, o reprimido “trashing” de “Pond Song” (que relembra Neil Young na fase “Rust Never Sleeps”), a directa “Budge”, e os enormes e patetas “riffs” de “Yeah We Know”.
Dois discos de prazer intenso misturado com sofrimento intenso.
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16 março 2009

Electronic # 8 - Doctor Rockit - “The Music Of Sound” (1996 Clear)

Matt Herbert empreendeu aqui um novo conceito musical, inspirado pelo “techno” mas frequentemente leve como uma pena, inspirado pelo “ambient” mas projectado para focar tanta atenção quanta conseguir produzir. Os seus trilhos rítmicos são trabalhados a partir de bizarras gravações, seja de uma pessoa a correr na praia ou de alguém a comer uma maça. Sinistras matrizes electrónicas são esculpidas, e distanciados arranjos de cordas e vibrafones são ligeiramente introduzidos, aludindo aos filmes de espionagem dos anos 60. Existem ainda faixas que são baseadas em gravações realizadas em meios onde Herbert se movimenta habitualmente, assim há uma ressonância pessoal quando ele próprio surge a tocar piano acompanhado pelas campânulas de uma igreja Italiana; ou a divertir-se com os seus amigos e os seus acordeões nasais num café de Viena. Também esta aqui incluída “A Quiet Week In The House”, uma bela e simples banda-sonora para um filme animado de Jan Svankmeyer.
A primeira metade do disco tem uma consciência mais experimental; a segunda metade assenta em exercícios rítmicos levemente mais fáceis e directos. Sempre muito delicadamente trabalhados, os sons parecem dar impressão de estarem filtrados e despojados, e existe imenso espaço.
Ao juntar citações da cultura popular com referências muito pessoais e uma animada atitude experimental em relação à tecnologia, Herbert criou uma música muito particular que impressiona por ter muito em comum com muitas das correntes artes visuais. Podem rotula-lo de banda-sonora imaginária ou après-techno, se quiserem, para mim, é somente um tipo de arte encantadora.
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13 março 2009

Pop # 5 - Aimee Mann - “Lost In Space” (2002 SuperEgo Records)

Ainda bem que Aimee Mann teve problemas com a editora multinacional onde estava, pois a pressão que esta exerceu sobre Aimee, para que editasse um disco mais comercial, resultou num acordo que lhe deu a sua independência. Essa liberdade fez com que a ex-‘Til Tuesday renascesse e regressasse, já na sua própria editora, mais consistente como compositora e como executante. Primeiro com “Bachelor No.2“ (também um disco notável) e depois com este “Lost In Space”, onde nos oferece mais uma viagem muito pessoal, por um mundo onde as personagens alienadas da sociedade tentam encontrar o seu lugar nesse mundo, muitas vezes com consequências devastadoras.
As letras são incrivelmente mordazes e cheias de significado, onde as forças condutoras são ressentimento, frustração e desespero, resultando num sombrio ambiente que percorre o disco.
A voz profundamente nasal de Mann condiz perfeitamente com as letras causticas, que pronunciam exactamente aquilo em que pensamos, mas que muitas vezes temos dificuldade em expressar.
Aqui existe uma mescla de vários géneros musicais que são elevados para novos patamares, criando uma sonoridade muito própria – distinta, rica e celestial.
Tal como “Yankee Hotel Foxtrot” dos Wilco, não existem aqui “singles” óbvios pois o disco funciona como um todo, no entanto, no entanto neste excelente conjunto de canções, articuladas e inteligentes, destacam-se algumas pela sua perfeição - as àsperas “This Is How It Goes”, “Invisible Ink”, as soberbas “Humpty Dumpty” e “Pavlov’s Bell”, a genial “The Moth”, “Real Bad News” e “Guys Like Me”.
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11 março 2009

Covers # 8


Mais uma ronda à procura de versões, e esta é especialmente dedicada a Lou Reed e os Velvet Underground. Como há tantas versões disponiveis fica desde já prometida uma segunda "edição".
Primeiro os globetrotters musicais DeVotchka:
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Esta versão é deve ser das primeiras que foram realizadas, mas como recentemente é que comprei o disco, ainda me está no ouvido:
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O projecto revivalista "glam" de David Sylvian e Mick Karn, criou esta que é uma que gosto particularmente:


Finalmente para acabar, uma versão radical de uma das canções mais perfeitas
(e mais conhecidas) de Reed.

06 março 2009

Classic # 18 - Love – “Forever Changes” (1967 Elektra)

Um dos mais perfeitos discos alguma vez registados, impressiona-me pelos exuberantes arranjos, pelas estruturas acústicas e pelo tom melancólico. E apesar de parcialmente soar como um produto do seu tempo, o disco é extremamente sofisticado musicalmente. Está repleto de instrumentos, de excelentes sinfónicas orquestrações (por David Angel), de sumptuosas harmonias vocais, de distintas melodias, de uma atmosfera sombria e uma grande produção de Bruce Botnick e Lee. Apesar de baseados em Los Angeles, a sua sonoridade não tinha nada a ver com contemporâneos como The Doors, pois a sua música envolve vários estilos, como “folk” e “jazz” o que a torna difícil de catalogar. Por essa altura Lee tornou-se incrivelmente fatalista, convencido que iria morrer e que este seria o seu último testamento, e sabendo que não conseguia competir com a energia eléctrica do seu amigo Jimi Hendrix, Lee decidiu investir num som mais introspectivo.
Tal como a fantástica capa do disco, é um disco cheio de vida, uma rodopiante colecção de cores, estados de espírito e emoções. E alguém pode duvidar disso depois de ouvir o primeiro tema - “Alone Again Or” – começa com a sua contagiante e serena guitarra acústica para depois inesperadamente surpreender-nos com o majestoso e hábil solo de trompete. E o que parece ser uma canção de amor transforma-se numa noção “hippie” em que o narrador proclama “could be in love with almost everyone”.
Os temas são interpretados de uma forma triste, (a paranóia e a morte misturam com temas mais animados) mas nunca oprimida, e ao longo do disco existe uma vivacidade até nas canções mais delicadas como na visão apocalíptica de “Andmoreagain” ou “The Good Humor Man He Sees Everything Like This”. Mesmo nas canções mais “rock”, na propulsiva “A House In Not A Motel” ou na realista “Live And Let Live” o tom é subjugado e a ira é controlada. As visionárias “Maybe The People Would Be The Times Or Between Clark and Hillsdale” e “You Set The Scene” são autênticos postais da era - o verão do amor, cínico e desesperante, formoso e imponente – onde na última tão bem se reflecte a realidade nos seus momentos de solidão e optimismo existencial.
Arthur Lee é um dos mais sobrestimados compositores de todos os tempos, e esta primeira incarnação dos Love foi a melhor pelo seu incompatível convívio com Bryan Maclean.
Indescritivelmente essencial.
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04 março 2009

The Durutti Column - Discografia Selectiva

“The Return Of The Durutti Column” (1980 Factory)
“LC” (1981 Factory)
“The Guitar And Other Machines” (1987 Factory)
”Vini Reilly” (1989 Factory)

O ironicamente intitulado disco de estreia, resultou de que devido a diversas singulares circunstâncias, Vini Reilly ficou de fazer um álbum sozinho com Martin Hannett. O resultado é um disco muito simples, mas com um grande charme. A forma de tocar levemente relaxada de Reilly isolado em pranto num canto, é suportada apenas pelas extremamente espaçadas sequências rítmicas de Hannett. Este certamente percebeu que “menos é mais”. “Sketch For Winter” e “Collette” são particularmente belas, e onde o doloroso som das guitarras imediatamente induz um sentimento de nostalgia.
O segundo disco dos TDC surgiu em 1980 e o seu título – LC – foi baseado no movimento político italiano “Lotta Continua”. Desta vez Reilly envolveu-se mais na gravação e trouxe o seu colaborador de longa data, Bruce Mitchell, para tocar bateria. Não surpreende que Reilly surja aqui mais confidente, mas ainda existe uma qualidade intimista, tipo “caseira”, parcialmente porque não participam mais nenhuns músicos, parcialmente porque usaram um gravador de quatro pistas TEAC. Reilly invoca emoções dos pedais de efeitos e restante equipamento, e chega a cantar em algumas canções (algo que até os seus maiores apreciadores desaprovam). É certo que as vocalizações são bem misturadas na retaguarda, mas “The Missing Boy” (sobre a morte de Ian Curtis dos Joy Division) é uma canção tão boa, que faz-nos pensar o que aconteceria se ele tivesse convidado alguém para a cantar.
Com “The Guitar And Other Machines” (1988), estavam hesitantes em realizar um disco “pop”, mas a força de carácter de Reilly assegurou que tal não acontecesse. Este disco é fascinante – Reilly aprendeu a trabalhar com sequenciadores, e alargou a palete sonora ao incluir a “viola” de John Metcalfe e a harmónica de Rob Gray. Finalmente encontrou as apropriadas vocalistas em Pol e na chinesa Liu Sola. E até existe um verdadeiro produtor na figura de Stephen Street. Uma canção como “When The World” tem mais estruturas do que era habitual, com paragens, solos rabiscados e inclusive um refrão.
Recuando um pouco da cratera latente do “pop” ”Vini Reilly” de 1989 ainda conta com a participação de Street, mas têm Reilly na co-produção. Aqui adicionou o “sampling” aos seus atributos e vários “samples” vocais estão disseminados pelas canções. A sonoridade é grandiosa e quente de uma forma melancólica, devido principalmente à maior presença da vigorosa guitarra acústica.
Os quatro discos são todos notáveis, e se prefiro “The Guitar And Other Machines, desconfio que é pela tensão existente entre a disciplinada produção de Stephen Street e a auto-indulgência genial de Vini Reilly”.
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