18 junho 2009

Pop # 6 - Galaxie 500

“Today” (1988 Aurora)

“On Fire” (1989 Rough Trade)

“This Is Our Music” (1990 Rough Trade)

Aparentemente a ortodoxa combinação de guitarra, baixo e bateria do trio Galaxie 500 continha inapreensíveis e caprichosas qualidades.
As suas invulgares canções – especialmente no impressionante “On Fire” e no excelente “This Is Our Music” – são na sua essência simples e directas, mas eles entregaram os seus segredos lentamente.
A música era opaca, parcialmente devido à produção com rédea branda de Kramer, “fechando”as guitarras de Dean Wareham, repercutindo o seu queixume nasal e adicionando algumas ideias para os arranjos. E segundo o próprio grupo, apesar de Kramer fumar quantidades épicas de marijuana, os efeitos são subtis e em certos momentos subliminais.
A forma como estes três colegas de escola tocavam tinha uma inquietante e surrealista sensação de sempre pairar no ar, com as canções a desfraldarem-se de uma forma linear, mas em vagas, onde o contraste entre a voz desastrada e desafinada de Wareham e a voz flutuante e etérea de Naomi, acrescentava profundidade e equilíbrio. Aqui a guitarra caótica e retumbante de Wareham – com um pendor ocasionalmente vibrante e inflamado numa feroz e intensa erupção eléctrica, profundamente influenciado pelos Velvet Underground – encontrou contraponto no ponderado, cuidadoso baixo de Naomi Yang e na ondulante bateria de Damon Krukowski. “This Is Our Music” exemplifica este confronto, especialmente em “Fourth Of July” e na incandescente versão de “Listen, The Snow Is Falling”, original de Yoko Ono.
O seu disco de estreia, o amargo e romântico “Today” é mais experimental em comparação com os seguintes, mas ainda possui a sua quota de preciosidades - como a sensual e poderosa “Tugboat”, a dócil no entanto assombrosa “Flowers”, ou It’s Getting Late”.
“On Fire” demonstrou a sua crescente competência técnica, possibilitando uma sonoridade mais hermética e é estruturalmente mais possante e o mais unificado, recheado de canções consistentemente calmantes e harmoniosas, exemplificando o que fazem melhor na trágica “Blue Thunder” (uma das mais emotivas e corajosas canções que já ouvi), no sentimento proscrito de “Strange”, no turbilhão de “Snowstorm”, na beleza de “Another Day”, e na perfeita reconstrução do original de George Harrison, “Isn’t It A Pity”
“This Is Our Music” é um luxuriante épico onde guitarras acústicas e eléctricas rodopiam numa magnificente bruma, recheado de canções brilhantes e incomparáveis, como a incrível “Fourth Of July” (provavelmente a mais forte dos G500), a surreal “Hearing Voices” ou a soberba “Summetime”. A edição em CD inclui ainda a deliciosa “Here She Comes Now” (original dos Velvets).
Em 1991 durante uma tourneé completa pelos Estados Unidos e Europa suportando os Cocteau Twins, separaram-se em amargas circunstâncias: Wareham formou os Luna, os quais ele avalia como mais importantes, e Krukowski e Yang tornaram-se primeiro em Damon & Naomi e posteriormente nos Magic Hour. Desde essa altura, todos eles produziram muito boa música, mas estes discos revelam os Galaxie 500 como um dos grupos mais enigmáticos de tempos recentes.
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15 junho 2009

Classic # 21 - Serge Gainsbourg - “Histoire De Melody Nelson” (1971 Philips)

Se bem que Gainsbourg já tivesse determinado para si próprio, uma vida recheada de provocações e comportamentos semi-proibidos, como adição à de estrela musical, as partes nunca encaixaram tão perfeitamente como em “Histoire De Melody Nelson”, que pode ter só 28 minutos, mas que 28 minutos. Uma hábil e intrigante história baseada no brusco romance do narrador com a jovem ninfa Melody do título, de apenas 14 anos. E onde Serge exercitou uma orquestra de 50 elementos com uma destreza que faz com que as obras contemporâneas grandiosamente propensas como “Tommy” dos The Who, pareçam imensamente deselegantes.
Seguindo o seu impulso para chocar, a história é Gainsbourg no seu método tipicamente atenuante: conheceu Melody depois de a derrubar na sua bicicleta com o seu Rolls Royce, depois planeia transporta-la bizarramente para Sunderland, mas entretanto ela morre numa acidente de aviação.
Melody é bem representada no disco e na sua capa pela grávida, no entanto ainda púbere Jane Birkin (sua companheira de vários anos), enquanto a música (criada em colaboração com Jean-Claude Vannier, e que foi samplado por Massive Attack e Portishead, entre outros) alterna desde a resolutamente cinemática “Melody”, passando por várias ritmadas baladas, pelo interlúdio orgiástico “En Melody”, com os risinhos despropositados de Birkin, antes de concluir com o imperioso e trágico “Cargo Culte”.
Uma obra-prima inundada com delicadas guitarras, luxuriantes arranjos de cordas e impetuosos coros, que continua a atrair atenção, pelo numeroso numero de admiradores famosos (Air, Beck), e que serviu de planta para obras como “This Is Hardcore” dos Pulp.
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05 junho 2009

Extremos # 5 - U.S. Maple – “Long Hair In Three Stages” (1995 Skin Graft)

No actual “rock moderno” não existe muito que desafie Jim O’Rourke, o músico, produtor e editor cujo interesse na “música sem precedentes” (ex: Bernhard Günter, Nuno Canavarro) é bem conhecido.
Mas em relação aos U.S. Maple, cujos dois primeiros discos produziu, O’Rourke simplesmente afirmou: “eu gosto dos U.S. Maple, porque quando os ouço, eles desafiam-me e isso é bom”.
Este quarteto de Chicago teve as suas sementes em minúsculas bandas de rock abrupto – Snailboy, Shorty, Diaper – e debutou como algo em que as raízes não se ligam a nenhum género.
Em “Long Hair In Three Stages”, a clivagem das guitarras gémeas (aqui não existe baixo), um sentimento acidental e a livre reciprocidade instrumental, conjugam uma sonoridade que junta o primitivo com o complexo e que remete para um Captain Beefheart em “Trout Mask Replica”. Mas o disco foi completamente escrito noutra linguagem, recheado de humor e níveis absurdos de ironia (verifiquem o gozo com as vedetas musicais), penetrante e confrontante, com explosivos andamentos temporais, onde tudo é misturado e é esta perplexidade musical que o torna tão agradavelmente provocador.
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03 junho 2009

Electronic # 11 - Pan Sonic - “Aaltopiiri” (2001 Blast First)

Em “Aaltopiiri”, os Pan Sonic, dão mais um passo em frente na direcção de caminhos mais quentes
As diferenças são subtis, mas vincadas, eles ainda seguem a trajectória minimalista da claridade rítmica tonal iniciaPoldas em “Vakio” (1995), mas agora existe uma sensibilidade “electro-dub” reminiscente do trabalho de Pole. Os elementos componentes destes temas podem ser reminiscentes da sonoridade dos Pan Sonic, mas soam mais a caixas de rimos dos anos 80 do que modernos osciladores e interruptores. Pois parece que agora respiram um novo ar, recheado de pequenas ondulações que geram novos espaços imaginados, onde se invocam cenários cinemáticos, como em “Aanipaa” (um “Trans-Europe Express” para o século XXI). Nota-se verdadeiramente que estão centrados em simplificados contrastes de espaço, volume e divisão temporal. A isto junta-se um manifestado toque humano que os distingue dos seus intimamente relacionados, numerosos e ruidosos produtores de algoritmos sonoros. E faixas como “Kone”, Muskaus” ou “Kierto” fazem-nos recuar 15 anos até ao esqueléticos “beats” de Marley Marl e Rick Rubin, quando as sonoridades rítmicas eram feitas através de batimentos leves no cimo de um microfone.
Ao longo do disco, Mika Vainio e Ilpo Väisänen cultivam um equilíbrio precário entre o elegante formalismo das suas próprias “construções” e a ameaçada proliferação caótica do “feedback”. E mais uma vez atingem uma fundente perfeição.
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