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28 outubro 2010

Women – “Public Strain” (2010 Jagjaguwar)

O disco homónimo de estreia dos canadianos Women, editado em 2008, mostrou muita qualidade com a sua fantástica energia, mas para muitos, o seu nervoso, barulhoso “art-rock” e experimental “pop”, era um pouco pesado no seu casamento entre melodia e abrasão.
“Public Strain” definitivamente não é “Women 2.0”, é mais longo e as maciças ondas sonoras que ainda tentam aperfeiçoar, parecem agora verdadeiramente capazes. Enquanto o primeiro álbum foi coroado com fortes melodias e elevadas, no entanto belas, camadas sonoras, “Public Strain”, tem o seu foco na capacidade de composição e nas firmes melodias, é o som de uma banda a soltar-se e a alargar a sua palete sonora numa muita mais poderosa e coesa visão. Os Women continuam a fugir a uma categorização fácil, e assim é indiferente se os chamarmos de experimentalistas “pop” ou “noisemakers”, uma coisa é clara, o que eles fazem é excelente.
Melodiosos, artísticos e possuindo os impecavelmente cativantes “riffs, soam tentadoramente inovadores e ”refrescantes”, as canções ganham forma através das suas melodias, da impressionante destreza e da intrincada musicalidade da banda, que combina hermeticamente as progressões que soam singularmente livres, nas enormes “walls of sound”.
Eles podem lembrar os Deerhoof ou os Liars, mas o seu “modus operandi” (misturar luz com sombras, “noise” com “pop”) foi praticamente inventado pelos The Velvet Underground. Mas o que é fundamental, é que eles absorveram estas influências, mas sem as imitarem, retirando o que queriam, e destilando-as em algo novo. Ao fazerem isso, eles provam que são uma das mais versáteis e imprevisíveis bandas actuais. E quando chegamos ao épico “Eyesore”, que exibe os variados pontos fortes da banda – a atmosfera dos seus temas “noise”, os “riffs” angulares dos seus números “pop” e aquela pureza “rock” sempre à espreita - só apetece começar a audição novamente.
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19 outubro 2010

Tributo # 13 - Can

Os Can surgiram em 1968, na cidade de Colónia. A anarquia, novas liberdades e novas questões estavam no ar. A Europa Ocidental estava a adoptar novas formas de pensar o seu futuro, e os jovens alemães levaram a necessidade de revolução para o coração.
O teclista Irmin Schmidt tinha sido aluno do pioneiro da música electrónica Karlheinz Stockhausen, e durante esse período, Schmidt conheceu Holger Czukay, que na altura compunha extremamente complexas peças musicais e que se tornou baixista enquanto ganhava a vida como professor de música.
Um dos alunos de Czukay, o guitarrista, Michael Karoli, estava convencido de que os The Beatles e os The Rolling Stones eram melhores do que Stockhausen e Beethoven. Ele demonstrou-o a Czukay ao tocar “I Am the Walrus”, um momento decisivo para Czukay, pois este percebeu que era possível ser-se musicalmente audacioso no contexto de uma canção “pop”.
Entretanto Schmidt estava a ficar cada vez mais aborrecido com os seus estudos formais da música e cada vez mais encantado pelos sons radicais provenientes do mundo do “rock”, especialmente, os The Mothers of Invention, os The Velvet Underground e Jimi Hendrix, ou seja, música eléctrica que incorporou improvisação, dissonância, elevados volumes sonoros e, provavelmente o mais importante, o ritmo percussivo – um elemento que a música clássica, mesmo nos seus modelos mais “avant-.garde”, nunca incluiu.
Schmidt e Czukay decidiram formar um grupo para criar um novo tipo de música; nenhum tinha muito conhecimento do “idioma rock”, um facto que ambos consideravam uma grande vantagem, pelo facto de assim ser difícil seguir os “rock” clichés.
Recrutaram Karoli para tocar guitarra, e completaram o grupo com um amigo de Schmidt – o baterista Jaki Liebezeit - que tocava “free jazz” e “bebop”, e um itinerante artista negro norte-americano chamado Malcolm Mooney, que possuía a rara habilidade de improvisar letras que faziam um muito seu próprio sentido.
Os Can queriam fazer um tipo de música que combinasse elementos de “rock”, “jazz”, “r&b”, “world music”, electrónica, mas que no entanto não fosse nenhuma dessas, pois era crucial que essa música fosse apenas deles, caso contrário, não tinha interesse.
Liebezeit, também tinha começado a odiar as suas performances de “free jazz”, ele sentiu que o “free”, paradoxalmente, estava actualmente a matar a música, e começou a desenvolver um interesse nos ritmos “naturais” que podiam ser encontrados nas músicas étnicas, ritmos que podem ser multifacetados e complexos e ao mesmo tempo facilmente “sentidos” e “compreendidos” pelo corpo humano.
Desde o início que a música dos Can se caracterizou pelos fortes poliritmos da percussão e pela densa interacção instrumental, como é visível nos 20 minutos de “Yoo Doo Right” do primeiro álbum “Monster Movie”.
Foi no seu próprio estúdio de gravação situado num velho castelo chamado Schoss Norvenich, a cerca de meia hora de Colónia, que os primeiros álbuns da banda foram gravados (o japonês Damo Suzuki substituiu Mooney após a edição do primeiro). A música dos Can foi construída no princípio de que “everyone solos, no one solos” – ou seja, a música era sobre o “tecido” e não sobre os “tecelões”. As peças têm frequentemente uma “qualidade fabricada” – Czukay, como engenheiro chefe, esculpia as “jams” livres, através da edição e da mistura, dando-lhes estrutura e espaço para respirar.
Foi a espontaneidade e a forma quase telepática de trabalharem em conjunto que criou o verdadeiro génio e que os fãs consideram os seus melhores anos: “Tago Mago”, “Ege Bamyasi”, “Future Days” e “Soon Over Babaluma”.
Todos os álbuns foram gravados em duas pistas, o que é surpreendente tendo em conta a densidade de informação sónica que contêm. Mas Czukay, sentiu que o uso de “multitracking” foi o princípio do fim, pois incentivou o grupo a pensar em si mesmos como “players” mais preocupados com as suas partes do que contribuírem apenas com o que era necessário para a excelência do todo. E isto é evidente nos últimos discos dos Can, já com Rosko Gee no lugar de Czukay, e com a adição do percussionista Reebop Kwaku Baah. O grupo tinha melhorado como “players”, no entanto a música perdeu a sua inefabilidade, o seu mistério e assim o seu real poder.

07 outubro 2010

Rock # 17 - Hüsker Dü – “New Day Rising” (1985 SST)

Dos vários “clássicos” editados pelo Hüsker Dü, “New Day Rising” é uma excelente afirmação de intenção e será provavelmente o melhor da sua carreira.
Literalmente esmagador, ele recomeça onde “Zen Arcade” acabou e simplesmente dispara, capturando a banda numa fase onde eles se encontravam a passar do veloz “hardcore” dos discos anteriores para a sonoridade mais melódica dos álbuns que se seguiram. A velocidade das canções é ligeiramente inferior, mas a intensidade do fluxo nunca cessa.
A capacidade conjunta de composição de Grant Hart (provavelmente melhor em “Flip Your Wig”) e Bob Mould nunca funcionou tão bem como aqui, onde o perverso sentido de humor de Hart surge como um contraponto mais ensolarado às escuras e torturadas obsessões de Mould. Tal como os Velvet Underground nos anos 60, eles estavam a re-escrever as regras do “rock” e “pop” mas também do “hardcore” e “punk” de um só golpe.
O disco está recheado de grandes canções, sempre carregadas de emoções, onde a guitarra de Mould é nitidamente ameaçadora e implacável, a bateria de Hart é quase “jazzística”, de fluxo livre e a dirigir velozmente e sem fôlego as canções para a frente e com o baixista Greg Norton a colar as coisas com subtis ganchos melódicos.
Desde a selvagem, incendiária “New Day Rising”, passando pelo brilhante épico “Celebrated Summer”, pela explosiva “I Apologize”, pela vigorosa “Terms of Psychic Warfare”, pela política “Folklore”, pela “trashy” “Punch Drunk”, pela melancólica “Girl Who Lives On Heaven Hill”, pela excelente “Books About UFO’s” até chegarmos ao colapso sonoro de “Plans I Make”, este registo ficará para sempre como uma das indiscutíveis referências do “rock alternativo” americano dos anos 80.
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10 setembro 2010

Classic # 28 - The Stooges – “Fun House” (1970 Elektra)

Se considerar que o primeiro álbum dos The Stooges era essencialmente o som de uns anti-sociais a tocarem o mais cru “garage-rock” possível, repetindo continuamente os mesmos brutais “riffs” de “blues” até atingirem um sentido de ritmo hipnótico no qual a guitarra “guinchava” e o vocalista Iggy Pop cantava contos urbanos que precediam a ascensão do “punk”, o disco seguinte, “Fun House”, ampliou o diagrama sonoro e impulsionou os limites do que o “ rock’n’roll” primário poderia ser ao extremo.
Provavelmente derrotando a sua fonte de inspiração - “White Light/ White Heat” dos The Velvet Underground - no seu próprio jogo (embora por meios um pouco diferentes), eles gravaram o que é indiscutivelmente um dos álbuns mais intensos de sempre, encontraram o equivalente musical da mais desenfreada, anárquica, torturante festa que qualquer homem jamais poderia conceber – simultaneamente terrível e fascinante na sua completamente selvagem naturalidade.
No disco de estreia, Iggy era um vocalista mais conflituoso do que qualquer outro do seu tempo, mas aqui ele surge como se estivesse no meio de uma transe tribal, que exigia a completa submissão” do corpo, mente e alma. As letras complementam a música perfeitamente, mas isto não é poesia para ser analisada ao mesmo nível de seriedade do que seriam letras de Bob Dylan, mas nada poderia ser mais apropriado, no calor do momento que a ladainha “I feel alright” repetida durante o fim incendiário de “1970”.
O registo está carregado com o mais directo “garage-rock” - “Down On The Street”, “Loose”, “T.V.Eye” - e seguidamente e de uma forma lenta entra em improvisação livre (juntando-se aqui para o resto da viagem o saxofonista Steven Mackay, que irá rivalizar os solos com a guitarra de Ron Asheton). Eles tiraram as suas sugestões directamente da então contemporânea cena “avant-gard” “ jazz”, e culminam com o apocalíptico “L.A. Blues”, a única lógica conclusão, quase cinco minutos da mais chocante e pura dissonância que sintetiza o manifesto do álbum. Mas um dos aspectos mais importante deste álbum é a forma como as músicas funcionam como um todo coeso, e 40 anos após o seu lançamento original, quando até mesmo a sua editora recuou perante o seu ruidoso, sujo e brutal “rock’n’roll”, nada pode diminuir a energia pura e genialidade emaranhados nesta celebração irrestrita. “Funhouse” é “Detroit Rock” no seu melhor, servindo como crucial diagrama para o “punk”, “post-punk”, “new wave” e “noise/art rock”.
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06 setembro 2010

Pop # 14 - Luna - “Lunapark” (1992 Elektra)

Primeiro com os Galaxie 500, e seguidamente com os Luna, Dean Wareham conseguir formar uma elegante carreira a explorar os cantos e os recantos do auto-titulado terceiro disco dos Velvet Underground.
Tal como Lou Reed, Wareham é um mestre no jogo das palavras geradas a partir de conversas mendanas.
Mas onde Reed comemora as agrestes histórias do “underground” de Nova Iorque, Wareham prefere escrever canções de amor para os neuróticos urbanos que assombram as áreas do Lower East Side.
Escolher um disco favorito dos Luna, é então tão difícil como escolher entre “What Goes On”, “Pale Blue Eyes” ou “Beginning To See The Light” dos Velvet.
Mas, pelo menos hoje, fica aqui uma inclinação para o disco de estreia da banda.
Em “Bewitched” arredondaram a sonoridade da banda com um segundo guitarrista; “Penthouse” aperfeiçoa o estilo Luna; e “Pup Tent” acrescentou algumas lúdicas ondulações experimentais. O sonhador “Lunapark” é o que se sente mais relaxado e mais variado, com o ex-baterista dos The Feelies, Stanley Demeski e o ex-baixista dos The Chills Justin Harwood a trazerem uma sensação de firmeza e coesão na performance que por vezes faltava na derivação estética dos Galaxie 500 e com Wareham a providenciar melodias eternas e memoráveis na harmoniosa guitarra e nas elevadas vocalizações.
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23 agosto 2010

Rock # 16 - Pixies – “Surfer Rosa” (1988 4AD)

Na sequência do surpreendente mini-LP “Come On Pilgrim”, este mortífero disco de estreia dos extraterrestres de Boston é tudo o que viria a ser futuramente afinado para o impecável “Doolittle” e novamente “rasgado” para “Trompe Le Monde”.
Brilhantemente desalinhado, explosivo, sujo e cru, para além das reflexões mais delirantes dos Sonic Youth, esta sonoridade era basicamente inédita na época. É uma soberba mistura da melhor capacidade de composição, de letras loucas e perturbadoras, de guitarras abrasivas e de uma melodia verdadeiramente impressionante.
Black Francis surge aqui mais psicótico do que nunca, as suas vocalizações alternam entre gritos e pensativas reflexões, Joey Santiago continua a provar que é um dos mais subestimados guitarristas de sempre, e o estrondoso rufar de David Lovering dá às músicas uma qualidade superlativa.
Tal como os Velvet Underground, os Pixies sempre tiveram os seus lados mais abrasivos e mais suaves, e foram capazes de os demonstrar num registo único, e muitas vezes dentro da mesma música.
Este é o mais resoluto, áspero e agudo disco, menos filtrado, as canções são editadas para eliminar qualquer nota que não seja absolutamente necessária – isto claro obra de Steve Albini – e assim elas surgem brutais, com guitarras altamente distorcidas e letras sobre incesto e injúrias, mas no entanto são bastante cativantes e melódicas.
Desde o soco inicial dado pelos clássicos por excelência, o enlouquecido e desafiante “Bone Machine” e o rápido e furioso “Break My Body”, passando pela deliciosa interpretação de Kim Deal em “Gigantic” (um assombroso e assustador hino sobre o voyeurismo infantil), pela excelentemente intensa “River Euphrates”, ou pela arrepiante beleza do inesquecível “Where Is My Mind?”, o clímax do álbum, e uma das melhoras músicas dos anos 80.
Um grande disco que provou ser massivamente influente em praticamente todas as futuras áreas do rock alternativo.
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21 maio 2010

Do fundo da prateleira # 23 - The Nectarine No. 9 – “Received Transgressed & Transmitted” (2001 Beggars Banquet)

Davey Henderson pode nunca ter escrito uma canção “pop” ambiguamente simples – nem mesmo nos WIN, a sua ostensiva tentativa de seduzir o “mainstream”, ele se mostrou incompreensivelmente ambicioso para os gosto das massas - mas o ex-Fire Engines também não é um incorrigível vanguardista.
Este disco é uma imprecisa delícia, do eternamente desvalorizado colectivo formado pelo famoso erudito do “post-punk” de Edimburgo. Cada álbum dos Nectarine No.9 centra-se na capacidade alquímica que Henderson tem em encontrar beleza no caos, enquadrando no processo um bizarro círculo que agrupa Captain Beefheart, Marc Bolan e Charles Bukowski.
“Received Transgressed & Transmitted” evidencia que essa capacidade para encontrar a mais doce melodia através das colagens sonoras do seu grupo só tem melhorado com a idade.
Aqui a formação de três vertentes de guitarra dos Nectarine No.9 é aumentada com a presença do clarinete de Gareth Sager (ex-The Pop Group ) e camadas de desarticulações electrónicas. Considerando que todos exceptuando Henderson e o guitarrista Simon Smeeton vivem em diferentes partes do Reino Unido, a empatia que o grupo demonstra em “Pocket Rainbows” (uma excêntrica abordagem ao “reggae”), na relaxante melodia e no puro prazer de “Constellation of A Vanity” e na beatifica felicidade de “Lazy Crystal” é verdadeiramente notável.
Daqui por 20 anos provavelmente poderão ser tão legendários como os Velvet Underground. Mas é claro que podemos usufruir do prazer já hoje.
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14 abril 2010

Do fundo da prateleira # 22 - The American Analog Set – “The Golden Band” (1999 Emperor Jones)

A beleza intransigente é uma das coisas mais difíceis para um artista realizar. O verdadeiro objectivo da beleza é lançar um feitiço sobre a audiência, para colocá-los em êxtase. A criação artística da beleza envolve saber o que torcer e virar e até onde e quando parar, e tem que ser feito de forma orgânica e inconsciente. Assim, quando uma banda libertina mais conhecida por um furioso “rock” de confronto e um orgulhoso amadorismo cria uma obra de rara beleza, é um momento importante. Com os The American Analog Set, aquele “indie rock”, conflituosamente contrário, abraça plenamente uma beleza exuberante.
Através da utilização de equipamento de gravação analógico, baseando-se numa secção rítmica muscular subjacente aos sintetizadores analógicos e numa voz macia a cantar serenamente, “The Golden Band” é uma obra de beleza refinada da primeira até à última nota. A banda utiliza como ponto de partida canções curtas e bonitas tal como os The Velvet Underground as usavam para neutralizar a sua penetrante escuridão, e em seguida baseiam-se nelas até que as mesmas se tornem em quentes e exuberantes tapeçarias de sonoridades pulsantes (mas nunca sonoramente aglomeradas). Como uns mais estanques Galaxie 500, os The American Analog Set tocam canções ricamente alusivas, e cujos apertados e compactos arranjos florescem como flores quando os escutamos. E podemos ser tão embalado para não nos apercebermos que estamos a ouvir algo tão revolucionário como um trabalho de qualquer ícone do “indie” ou “punk”. Este é um disco de uma beleza simples e subtil. E num mundo onde o antídoto ao estridente niilismo “indie”, é um estridente comercialismo, um álbum com a calma e a confiança anacrónica como “The Golden Band” soa estranhamente, como um manifesto.
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22 março 2010

Inovadores # 16 - Fire Engines – “Lubricate Your Living Room” (1980 Pop:Aural)

Este mini-álbum do grupo de Edinburgo ofereceu a mais fresca das várias abordagens sobre a guitarra eléctrica que surgiu no “pós-punk” escocês. Em apenas 18 meses, de uma forma caótica e sem convencionalismos, e através de 3 “singles” e um mini-LP, conseguiram deixar um durável impacto no “pós-punk” em geral.
Considerados como uma das mais importantes bandas do fértil movimento “pós-punk” escocesas do inicio do anos 80, a par com os mais “pop” Orange Juice e os ligeiramente mais acessíveis Josef K, os Fire Engines extraíram das mesmas similar influências, mas inclinaram-se numa direcção mais sombria e abrasiva - The Velvet Underground, Television, The Pop Group, The Fall .
Os guitarristas David Henderson e Murray Slade desbobinavam contorcidas, dissonantes linhas de energia que indicavam obsessão e confusão. A música, abrupta mas “funky”, discordante mas melódica, concisa e energética, reivindicou o “riff” de volta do “rock” – todas as composições são fabricadas a partir de inoportunos e repetidos acordes de baixo e guitarra. Mas não existia nenhuma comunhão com os regulares ritmos “rock” – a banda assentava no forte golpear, mas de invulgar andamento do ruidoso tambor de Russell Burn (que não utilizava címbalos ou “hi-hats”). As vocalizações de Henderson eram frequentemente guinchos e as canções eram essencialmente instrumentais de guitarra, mas fundamentalmente isso não interessava, pois existia uma contagiante, frenética energia presente na música.
O interesse da banda em perverter as neuroses do consumismo estava bem reflectido quer na embalagem (o disco originalmente vinha num saco de plástico) quer nos títulos humorísticos como “Plastic Gift” e “New Thing In Cartons”. Ouvindo o disco hoje, essa “lo-fi”, “live in the studio” abordagem, ainda surpreende pela invulgar sonoridade que a banda conseguiu atingir – o áspero, electrizante prurido das guitarras e a desprezível corpulência da impetuosa bateria.
Ainda tentaram seguir um aclarado “pop” com “Candyskin” (1981) e o acessível “Big Gold Dream” (1981), os seus últimos “singles”, mas terminaram imediatamente a seguir, tendo Henderson prosseguido carreira com os WIN e os The Nectarine Nº9, estando actualmente nos The Sexual Objects.
Mas ficamos com este rápido e delirante disco, que não poderá ser repetido.
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07 janeiro 2010

Classic # 23 - The Velvet Underground And Nico- “The Velvet Underground & Nico” (1967 Verve)

Por muitos considerado como o ponto de partida para a música alternativa, este disco realmente alterou a face do “rock”, mas também do “glam”, do “punk”, do “goth” ou do “indie”. Mas 43 anos depois, o que ainda mais surpreende é a sua audácia, a sua diversidade, a sua capacidade de experimentação sonora e a sua originalidade.
Sombrio e introspectivo, é a absoluta antítese, do movimento “hippie” que o resto da América andava a jubilar, e áspero como a cidade onde nasceu.
A música não é complexa, surge dispersa e escorregadia, mas é estranhamente compelível. E a estranha aliança entre Lou Reed e John Cale , fazia com eles experimentassem algo diferente em cada canção, através das hipnóticas espirais de dissonantes guitarras e viola, sempre apoiados pela poderosa bateria de Mo Tucker e com Sterling Morrison a agregar toda a mutilação sonora. Ao juntarem o contraste entre a voz fortemente superficial de Reed e o suave trautear de Nico, e a ilustre escrita de Reed - com referências sinceras e directas ao sexo bizarro e drogas, algo que ninguém tinha coragem para abordar tão abertamente à 40 anos atrás, pois no passado grupos como The Beatles (em “Happiness Is A Warm Gun”) ou The Byrds (em “Eight Miles High”), escreveram sobre os mesmos controversos temas ambiguamente – criaram momentos verdadeiramente únicos.
Começando na volátil, celestial, simultaneamente fascinante e sinistra “Sunday Morning”, passando pelas implacáveis e puramente loucas imagens do completamente soberbo “I'm Waiting For The Man”, pela gentil e sedutora “Femme Fatale”, pelo perturbador e contundente exótico relato sadomasoquista da claustrofóbica “Venus In Furs”, pela a atitude fútil do desbotado “garage” de “Run, Run, Run”, pelo melancólico “avant-garde” de “All Tomorrow’s Parties”, pela assustadora e francamente brilhante confissão no surreal épico “Heroin”, ou pela invulgarmente delicada e encantadora “I’ll Be Your Mirror”, chegamos às duas últimas canções que efectivamente representam a criação do rock alternativo: a convulsiva “The Black Angel’s Death Song” com a feroz e penetrante viola e a poesia absurda de Reed e a abismal batalha instrumental recheada de feedback presente em “European Son”, que absorve por completo o ouvinte.
Certamente Sonic Youth, Suicide, The Jesus and Mary Chain, Pixies, Smashing Pumpkins, My Bloody Valentine, entre outros, não teriam realizado os extraordinários álbuns que fizerem sem a existência deste magnifico monumento ao espírito brutal do “rock’n’roll”.
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30 novembro 2009

Classic # 22 - John Cale – “Music For A New Society” (1982 Ze/Island)

John Cale convida-nos a participar na sua particular viagem através dos sombrios recantos da vida, e nós num total devaneio consciente parece que acompanhamos a sua mente ao longo dessa viagem, recheada de indefinidas ânsias e saudades de algo desaparecido.
Estamos na presença de um disco esplêndido, mas que foi sempre extremamente subestimado na longa carreira de Cale.
Minimal, frugal e espectral (em completo contraste com as experiências “noise” do disco anterior “Honi Soit”), aqui existe uma arrebatadora sensação de desânimo, derrota, traição e desespero, que se senta lado a lado com pungentes passagens de pura beleza, entregues na desamparado e dramática voz de Cale.
Gentis mas perturbadoras baladas como “Taking Your Life In Your Hands”, “Thoughtless Kind”, “Sanities” ou “If You Were Still Around” (com letras de Sam Shepard) surgem acompanhadas por ameaçadoras e desarticuladas colagens sonoras, que substituem os “tradicionais” arranjos “rock”, e que provavelmente serve para demonstrar bem os instintos do ex-Velvet Underground, quer como experimentalista sónico, quer como criador de gentis melodias. Ouçam a forma como a maravilhosa “Risé, Sam & Rimsky-Korsakov”, edifica uma nova forma de expressão.
Um disco profundamente emotivo e inquietantemente pessoal, mas que nos acompanhará para sempre.
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John Cale - Taking Your Life In Your Hands

18 junho 2009

Pop # 6 - Galaxie 500

“Today” (1988 Aurora)

“On Fire” (1989 Rough Trade)

“This Is Our Music” (1990 Rough Trade)

Aparentemente a ortodoxa combinação de guitarra, baixo e bateria do trio Galaxie 500 continha inapreensíveis e caprichosas qualidades.
As suas invulgares canções – especialmente no impressionante “On Fire” e no excelente “This Is Our Music” – são na sua essência simples e directas, mas eles entregaram os seus segredos lentamente.
A música era opaca, parcialmente devido à produção com rédea branda de Kramer, “fechando”as guitarras de Dean Wareham, repercutindo o seu queixume nasal e adicionando algumas ideias para os arranjos. E segundo o próprio grupo, apesar de Kramer fumar quantidades épicas de marijuana, os efeitos são subtis e em certos momentos subliminais.
A forma como estes três colegas de escola tocavam tinha uma inquietante e surrealista sensação de sempre pairar no ar, com as canções a desfraldarem-se de uma forma linear, mas em vagas, onde o contraste entre a voz desastrada e desafinada de Wareham e a voz flutuante e etérea de Naomi, acrescentava profundidade e equilíbrio. Aqui a guitarra caótica e retumbante de Wareham – com um pendor ocasionalmente vibrante e inflamado numa feroz e intensa erupção eléctrica, profundamente influenciado pelos Velvet Underground – encontrou contraponto no ponderado, cuidadoso baixo de Naomi Yang e na ondulante bateria de Damon Krukowski. “This Is Our Music” exemplifica este confronto, especialmente em “Fourth Of July” e na incandescente versão de “Listen, The Snow Is Falling”, original de Yoko Ono.
O seu disco de estreia, o amargo e romântico “Today” é mais experimental em comparação com os seguintes, mas ainda possui a sua quota de preciosidades - como a sensual e poderosa “Tugboat”, a dócil no entanto assombrosa “Flowers”, ou It’s Getting Late”.
“On Fire” demonstrou a sua crescente competência técnica, possibilitando uma sonoridade mais hermética e é estruturalmente mais possante e o mais unificado, recheado de canções consistentemente calmantes e harmoniosas, exemplificando o que fazem melhor na trágica “Blue Thunder” (uma das mais emotivas e corajosas canções que já ouvi), no sentimento proscrito de “Strange”, no turbilhão de “Snowstorm”, na beleza de “Another Day”, e na perfeita reconstrução do original de George Harrison, “Isn’t It A Pity”
“This Is Our Music” é um luxuriante épico onde guitarras acústicas e eléctricas rodopiam numa magnificente bruma, recheado de canções brilhantes e incomparáveis, como a incrível “Fourth Of July” (provavelmente a mais forte dos G500), a surreal “Hearing Voices” ou a soberba “Summetime”. A edição em CD inclui ainda a deliciosa “Here She Comes Now” (original dos Velvets).
Em 1991 durante uma tourneé completa pelos Estados Unidos e Europa suportando os Cocteau Twins, separaram-se em amargas circunstâncias: Wareham formou os Luna, os quais ele avalia como mais importantes, e Krukowski e Yang tornaram-se primeiro em Damon & Naomi e posteriormente nos Magic Hour. Desde essa altura, todos eles produziram muito boa música, mas estes discos revelam os Galaxie 500 como um dos grupos mais enigmáticos de tempos recentes.
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11 maio 2009

My Favorites # 15 - The Feelies – “Crazy Rhythms” (1980 Stiff)

Originários de Hoboken, New Jersey, foram juntamente com Sonic Youth, Mission Of Burma ou Bush Tretas, uma das bandas da costa este que estiveram na vanguarda do movimento pós –punk americano. As ideias musicais de Glenn Mercer e Bill Million sobre minimalismo, dinâmicas, tonalidades e texturas musicais foram apoderadas pelo núcleo central dos músicos que integravam o emergente movimento “rock alternativo”.
Criaram uma inimitável e completamente única sonoridade, onde as suas canções tem uma evidente sensação de urgência e a sua sonoridade destilava uma perfeita sensibilidade estética. As guitarras de Mercer e Million são delicadas e elevadas – em contraste com os fortes acordes do “punk” – o incessante e descendente dedilhar, com crescendos sem clímax, e acções descontroladamente repetitivas é um óbvia influência dos Velvet Underground. Os ritmos – vocais e instrumentais – eram tensos e desassossegados – tal como os Talking Heads, mas com uma qualidade ameaçadora que foi meia abafada na música dos Heads, com as suas investidas na “world music”.
São inevitáveis as comparações com os grupos já referidos e os Television, mas “Crazy Rhythms” é tão impressionantemente original que é como se tivesse desenvolvido numa estufa desprovido de quaisquer influências ambientais. E o que torna o disco ainda mais inovador, foi o facto da percussão ser particularmente efectiva, em virtude da substituição do anterior baterista pelo extravagantemente inventivo Anton Fier. O seu frenético e forte tambor “tom-tom” tornou-se numa terceira voz no diálogo rítmico com os duelos de guitarra de Mercer e Million. Para além disso, o uso de um variado conjunto de instrumentos de percussão pouco convencionais (tamborim, “maracas”) e a acção combinada entre silêncio e ruído adiciona estrutura e solidifica o seu som. Daí resultaram momentos sublimes como a honestamente semi-biográfica “The Boy With Perpetual Nervousness”, “Fa Ce La”, a intensa “Moskow Nights”, a contagiante “Loveless Love”, a “estratificada complexidade de “Force At Work”, “Original Love”, a revoltada “Raised Eyebrows”, ou a irreconhecível e irreverente versão de “Everybody’s Got Something To Hide Except For Me And My Monkey” dos Beatles.
Um disco muito subestimado (e o único disco onde exerceram controlo criativo), ideal para descobrir as origens do “indie rock”/”rock alternativo”, onde muitos grupos - R.E.M., The Dream Syndicate, Yo La Tengo, até Clap Your Hands Say Yeah - retiraram elementos sonoros, mas que não são tão citados como alguns dos seus pares.
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11 março 2009

Covers # 8


Mais uma ronda à procura de versões, e esta é especialmente dedicada a Lou Reed e os Velvet Underground. Como há tantas versões disponiveis fica desde já prometida uma segunda "edição".
Primeiro os globetrotters musicais DeVotchka:
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Esta versão é deve ser das primeiras que foram realizadas, mas como recentemente é que comprei o disco, ainda me está no ouvido:
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O projecto revivalista "glam" de David Sylvian e Mick Karn, criou esta que é uma que gosto particularmente:


Finalmente para acabar, uma versão radical de uma das canções mais perfeitas
(e mais conhecidas) de Reed.

19 fevereiro 2009

Brian Eno – Discografia Selectiva

Como complemento a “Another Green World” e “My Life In The Bush Of Ghosts”.

Pop
“Here Come The Warm Jets” (1973)
“Taking Tiger Mountain” (1974)
“Before And After Science” (1977)
O primeiro disco a solo de Eno, “Here Come The Warm Jets” foi editado à trinta e seis anos e ainda hoje soa moderno e surpreendente, com a sua descarada combinação de “glamour”, “pop” clássico e do dramatismo dos Velvet Underground. São pequenas e singulares canções iluminadas por relâmpagos de demência.
“Taking Tiger Mountain” inspirado pela revolucionária opera Chinesa do mesmo nome, vai ainda mais longe e mais misteriosamente na mesma linha.
Em “Before And After Science”, o fértil sentido de fluidez na música de Eno, criou um disco clássico, onde um resplandecente e excepcionalmente invulgar “pop” (“Backwater”, “Kings Lead Hat”) aparece lado a lado com a imponente melancolia de “Julie With…” e “Spider and I”.

Ambient
“Music For Airports” (1978)
“On Land” (1982)
“Thursday Afternoon” (1985)
Tenho a percepção de que “Music For Airports” é um dos mais influentes discos dos últimos 30 anos, se não de sempre. Eno teve a distinta intenção de criar um novo tipo de música, que procuraria produzir atmosferas e texturas, ou se preferirmos “ambientes”, em vez de canções que se podiam assobiar. Ainda hoje soa comoventemente excêntrico.
“On Land” confia ainda menos em ferramentas convencionais, conjura sensações específicas aplicadas numa variedade de texturas sonoras que inclui “samplers” de sapos!
“Thursday Afternoon” foi especialmente desenvolvido para CD e Vídeo, (um peça de 61 minutos para uma instalação de Christine Alcino), e é espantoso.

Experiências instrumentais
“Discreet Music” (1975)
“Music For Films” (1978)
“Apollo: Atmospheres And Soundtracks” (1983)
Deitado na cama, após ter sido atropelado por um táxi, Eno descobriu que um dos canais da sua aparelhagem estava tapado, retribuindo a musica que escutava pouco audível por cima da chuva que cai-a. A semente da música ambiental foi disseminada com “Discreet Music”, uma longa peça título e três variações inspiradas no conhecido “Canon” de Pachelbel.
“Music For Films” é um atractivo pacote de pequenos fragmentos instrumentais que explora toda a extensão musical desde leves camadas ambientais até “funk” oblíquo.
“Apollo” foi produzido para o filme de Al Reinert sobre aterragens na lua e é uma brilhante invocação dessa grandeza que utiliza técnicas tão diversas como ruídos de tractores e reluzentes guitarras dobro.

Colaborações
“No Pussyfooting” (1973) com Robert Fripp
“Evening Star” (1975) com Robert Fripp
As colaborações de Eno são lendárias e aqui estão duas que são mais que pertinentes hoje. Os dois discos com Fripp eram bastantes avançados para o seu tempo – longas explorações instrumentais que eram distintas do rock progressivo da época pelo seu senso de risco e pela existência das fronteiras do conhecimento. Também nunca tivemos títulos como “Swastika Girls” pelos Yes.

04 fevereiro 2009

Editoras # 4 - Chemikal Underground - Uma Selecção







Mogwai – “Young Team” (1997)
Arab Strap – “Philophobia” (1998)
The Delgados – “The Great Eastern“ (2000)
The Radar Brothers –“And The Surrounding Mountains” (2002)

Os primeiros discos editados pela Chemikal Underground relembraram-me da ética da Postcard.

A Chemikal Underground sempre foi vista como a “pateta” prima teenager do rock britânico – e a sua singular petulância apenas reforça essa ideia (ainda se lembram daquelas t-shits utilizadas pelos Mogwai com o dizer: “Blur Are Shite). Na verdade, isso é apenas metade da história. Pois o catalogo inicial da editora escocesa pode ser imperfeitamente dividido em duas distintas categorias: o “pop” acústico facilitado pelos fundadores da editora, The Delgados, e o melancólico experimentalismo condensado pelos Arab Strap.
O disco de estreia dos Mogwai, “Young Team”, encaixa na segunda categoria. É uma viagem provocante – a colecção de fracturados “rock-out” instrumentais, variando desde as entorpecidas guitarras nos versos até às explosões de “feedback” no refrão. “Yes! I Am A Long Way From Home” é reminiscente da sonoridade praticada pelos padrinhos do “lo-fi” Slint, enquanto “Mogwai Fear Satan” ressoa até ao ruidoso final recheado de címbalos.
Mas enquanto as dinâmicas “silêncio/barulho ensurdecedor” dos Mogwai frequentemente obrigam os ouvintes a ajustar os volumes sonoros, os Arab Strap seguem uma ainda mais sombria forma melancólica de tocar guitarra no seu segundo disco “Philophobia”.
Guiados pelas vocalizações resmungonas de Aidan Moffat e unindo sonoridades Velvet Underground com o que soa a uma velha caixa de ritmos Casio, a sua “folk” acústica é deliciosamente triste.
Por contraste, nos The Delgados e nos The Radar Brothers, têm duas bandas desavergonhadamente acessíveis. O disco de 2000 dos primeiros, “The Great Eastern”, produzido por David Fridmann (na altura nos Mercury Rev), é um alegre disco de “pop” acústico que varia desde as harmonias estilhaçadas de uns Pavement (“Reasons For Silence”) até ao “rock” estival dos Teenage Fanclub (“Thirteen Gliding Principles”). Já as firmes vocalizações e as rígidas guitarras do assombroso “And The Surrounding Mountains” são reminiscentes da “folk” “lo-fi” de uns Smog. No seu melhor (“Rock Of The Lake”; “On The Line”) eles soam gloriosamente apaixonados.

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15 setembro 2008

Pop # 3 - Orange Juice - “You Can’t Hide Your Love Forever” (1982 Polydor)

Depois de um conjunto de singles para a Postcard, os Orange Juice até já tinham gravado o seu primeiro álbum - “Ostrich Churchyard” - quando assinaram pela multinacional Polydor, mas regressaram ao estúdio com o produtor Adam Kidron, alterando o som mais “garage-rock” do primeiro pelo cintilante “indie-pop” deste. Aqui presentearam-nos com um conjunto de canções cativantes e excitantes, cheias de dilacerantemente belas melodias, que se elevam e exercem o seu poder. Apoiados no crepitar zumbido das inarmónicas guitarras, superiormente lideradas por Malcolm Ross (que tinha abandonado os Josef K), na vibrante batida da bateria de Zeke Manyika e essencialmente em Edwyn Collins com a sua rígida e fora de timbre voz, num estilo inimitável, idiossincrático e unicamente sincero, produziram um som altamente original, por polir, espontâneo, que pegou na intensidade do “punk” e o seu grande idealismo e faculdade de diversão, e fundiu-a com uma romântica sensibilidade lírica e muita alma. Como influências apontam-se várias, Velvet Underground, The Byrds, The Buzzcocks, Television – e também são referenciados como precedentes da similar sonoridade desenvolvida pelos The Smiths (e como obvia influência no som de Stuart Murdoch e dos seus Belle & Sebastian). E só um grande compositor como Edwyn Collins, com as suas letras obliteráveis, tal como Morrissey, visionário, deprimido e levemente cínico, mas inteligente, honesto e credível, poderia abordar as fraquezas do amor e a sua falta de direcção, e criar a pletora de clássicos com a excelência de “Falling and Laughing”, “Satellite City”, “Consolation Prize”, “Untitled Melody” ou a icónica “Felicity”.
Edwyn Collins gravaria posteriormente bons discos, mas foi aqui que revelou o seu génio. Um disco de instantânea e ditosa alegria.
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Orange Juice - Felicity

16 março 2007

Classic #1 - The Modern Lovers – "The Modern Lovers" (1976 Beserkley)

Formados em Boston no início dos nos 70, são por muitos considerados como percursores do punk. Eram diferentes da maioria das bandas do início dos anos 70 (onde a decadência era o mote), pela sua forma de estar e de vestir. Com as suas actuações ao vivo, os Modern Lovers, chamaram a atenção da Warners, que os convidou a gravar uma demos em 1972/73, metade das quais seriam produzidas por John Cale. Mas quando Jonathan Richman disse que não pretendia tocar as canções ao vivo, a Warners anulou o contrato e não lançou o disco. Em 1976, Matthew Kaufman deixou a Warners para formar a Besrkley, e editou o disco com as demos gravadas em 1972/73. E apesar de não ser um álbum no verdadeiro sentido da palavra, este disco é o seu manifesto. É o disco que marca uma fase do som americano da época com a passagem das experiências psicadélicas (expoente máximo Velvet Underground ) para um rock cru e rudimentar. Canções de angústia, neuróticas, recheadas de comentários sociais introspectivos, e com letras adolescentes e bizarras (o que pretende com “Hospital”).
As canções não negam as influências de Lou Reed, em especial na forma como Richman canta e toca guitarra, ouçam “Astral Plane”, “Pablo Picasso” e “Someone I Care About”. O som é reforçado com o complemento musical providenciado pelo orgão Farfisa de Jerry Harrison.
E claro, contém esse clássico rock “on-the-road” que é “Roadrunner”.
Para mim, é esse som primitivo, em combinação com a voz nasal de Richman que faz com que este disco seja tão especial.

19 janeiro 2007

Camera Obscura - "Let's Get Out Of This Country" (2006 Merge)

"Are You Ready To Be Heartbroken?", perguntava Lloyd Cole em 1984. A resposta chega 22 anos depois, "Lloyd, I'm Ready To Be Heartbroken", canção de apresentação dos escoceses Camera Obscura, presente no seu terceiro disco "Let´s Get Out Of This Country", gravado na Suécia com o produtor Jari Haapalainen (já trabalhou com Ed Harcourt).
E a ligação pode ser encontrada na pop melódica, de cariz romântica. Estamos presente 10 canções com uma beleza orquestral notavel, apoiada nos excelentes arranjos da secção de cordas, e no clássico som do orgão sempre presentes. Canções como "Come Back Margaret", "If Looks Could Kill", ou "Dory Previn" (dedicado à cantora americana dos anos 70, que parece servir de inspiração para a vocalista Tracyanne Campbell). Outras influências que podem servir para entender o charme desta banda de Glasgow, que apesar de se ter formado em 1993, só editou o primeiro album em 2001, são as girls-band da Motown dos anos 60 (Supremes, etc), os Velvet Underground, e os The Pastels.
Recomendado aos fãs dos antigos Belle & Sebastian (expecialmente os que ficaram desiludidos com "The Life Pursuit".