28 fevereiro 2008

Ebay # 1 - Vários - “After Dark” (2007 Italians Do It Better)

Foi uma das revelações do ano transacto, mas o que é certo é que este disco, numa primeira abordagem parecia não prometer muito. Pois o que no papel poderia soar como algo de verdadeiramente intragável acabaria por se tornar num disco que é equivalente a um magnífico DJ set, pois é extremamente coesivo.
Inicialmente, o disco seria uma amostra com o objectivo de promover a editora americana Italians Do It Better e que colectava faixas soltas, demos, “remixes” e “covers”.
Estes artistas pegaram no som retro do “Italo-disco”, com os seus sintetizadores analógicos e as mais básicas caixa de ritmos, e conseguiram transporta-lo para o futuro.
Estamos perante um tipo de “slow-techno”, seria “synth-pop” se os ritmos não parecessem “desinteressados” em acompanhar a música.
Dos originais destacam-se temas que agora são bem conhecidos como: Chromatics - “In the City”; Professor Genius - “Pegaso”; Farah - “Law of Life”, mas ouçam o que os Glass Candy fazem de “Computer Love” dos Kraftwerk, ou a florescente “remix” que Mirage faz ao clássico “Last Night a Dj Saved My Life” dos Indeep.
Música de dança voluptuosa bem ao gosto de Giorgio Moroder.
£1.99

26 fevereiro 2008

Xiu Xiu - “Women as Lovers” (2008 Kill Rock Stars)

Um regresso excelente do prolífero grupo de Jamie Stewart, após o conceptual “Air Force”. Parece que a expansão dos elementos que o acompanham resultou em seu favor, pois se em discos anteriores o som padecia um pouco por confiarem em demasia nos sequenciadores MIDI, em “Women as Lovers” produzem um som mais rico e mais variado (apesar de continuar agreste), pois as canções diferem bastante umas das outras. Continuam a revelar uma surpreendente criatividade, e a encontrar maneiras de escapar a qualquer catalogação. Mas também nos presenteiam com alguns temas dos mais acessíveis que já criaram, como a claustrofóbica “I Do What I Want, When I Want”, uma canção francamente “pop” ou “In Lust You Can Hear The Axe Fall”.
Como de costume as letras são directas e muitas vezes chocantes, continuando com a abordagem de temas insólitos e dispares como o terrorismo, a transsexualidade, a violência doméstica ou o recrutamento de crianças para a guerra.
A colaboração de Michael Gira, numa surpreendentemente e eficaz versão de “Under Pressure”, originalmente gravada por David Bowie e os Queen, é uma escolha apropriada e um dos destaques do disco. Curiosamente a partir desta faixa, parece que o disco toma outro rumo, pois os temas são mais obscuros e experimentais, como que revisitando terrenos musicais já explorados em discos anteriores.
“Women as Lovers” é uma consolidação das diferentes matérias musicais e líricas que tem obcecado Stewart.
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22 fevereiro 2008

Arca de Tesouros: ebay

Há medida que os anos passam, a descoberta musical aumenta, e o orçamento para a aquisição das peças que sustentam esse enriquecimento não estica o suficiente.
Antigamente, e durante muito anos era na feira da vandoma que conseguíamos encontrar alguns discos a preços acessíveis que permitiam contrabalançar as aquisições mais recentes em lojas como as já extintas Tubitek e Bimotor, ou na Carbono e Piranha. E agora, é verdade que ainda temos a Louie Louie ou a Lost Underground, mas o Ebay é cada vez mais uma fonte de pesquisa e descoberta.
Foi há cerca de 5 anos que comecei a procurar discos no Ebay e posso dizer que já realizei mais de 400 transacções, de todo um pouco, desde os CD’s mais recentes, até aos 7” mais antigos, mas sempre nunca gastando mais de 2/3 euros por artigo. Pois o gozo é esse mesmo, descobrir pequenos tesouros perdidos, colocados à venda por pessoas que também estão a vender bonecos, roupa, revistas antigas ou chupetas, pois lojas virtuais a vender raridades e edições especiais a preços impeditivos é o que mais existe na Net.

Vou partilhar aqui algumas dessas aquisições.

18 fevereiro 2008

Inovadores # 8 - Melvins – “Bullhead” (1991 Boner)

Os Melvins sempre gostaram de baralhar a indústria musical, e ao longo dos anos, variaram entre estilos como noise, punk, metal ou stoner rock.
Será difícil ficarem na história do “rock”, mas podem ficar com uma nota de rodapé no capítulo dedicado aos Nirvana, por dois motivos: a passagem do baterista Dale Crover pela banda de Kurt Cobain, e pelo facto de terem criado uma versão descarnada, arrastada e psicótica do metal original dos Black Sabbath, ajudando a conceber o que mais tarde viria a ser apelidado de grunge.
O terceiro disco dos Melvins, “Bullhead”, é maravilhosamente grotesco, onde o grupo criou uma completa desordem naquilo que o “rock’n’roll” é suposto ser.
Aqui criaram uma densa superfície de fúria metálica forjada numa orgia de “feedback” em conjunto com uma pura e absoluta demência.
O disco começa abrasivamente com “Boris”, nove minutos de “riffs” de guitarra maciçamente repetitivos, e o magnifico trabalho realizado na bateria por Dale Crover, que torna impossível conseguimos acompanhar o ritmo.
“Anaconda” e “Ligature”, “Zodiac” seguem o mesmo brilhante caminho. Os ritmos são diminuídos até ao excruciar da morosidade.
O disco fecha com “Cow”, um dos melhores solos de bateria que já ouvi. Apesar de Dale Crover não ser um tecnicista, ele parece estar em lamúria sobre a bateria.
“Bullhead” é um exercício de resistência, completamente implacável na sua existência com a acessibilidade.

15 fevereiro 2008

Tributo # 4 - Roky Erickson/ 13th Floor Elevators

Felizmente o êxito do filme “Alta Fidelidade”, despertou o interesse para uma das bandas mais incrivelmente infelizes da história do “rock”, e em especial o seu co-líder, o genial visionário Roky Erickson.
São hoje considerados pioneiros, por terem sido uma das primeiras bandas a ter um som “psicadélico” e também percursores do garage-rock.
Originário de Austin, no Texas, Roky foi desde muito novo, fortemente influenciado para a música pela sua mãe, que era cantora. E cedo demonstrou um grande talento. Mal atingiu os 18 anos decidiu que iria formar uma banda. Após uma primeira experiência sem grande continuidade, conheceu Tommy Hall, um viciado em acídos que era bastante mais velho do que Roky, e que iria exercer uma influência muito forte sobre si, e assim decidiram criar uma banda (existe a história de que uma Janis Joplin iria ser a vocalista, mas receando que o seu envolvimento no grupo pudesse criar uma relação com drogas mais duras, preferiu recusar e ingressar no Big Brother and the Holding Company, e o resto da história já é conhecida, o que não deixa de ser irónico, se considerar-mos o percurso de drogas e a consequente morte daí originada de Joplin).
Adoptaram a designação 13th Floor Elevators, e lançaram em 1966 o primeiro single, “You’re Gonna Miss Me” (composto por Erickson), que obteve um sucesso razoável, e atraíram o interesse da Internacional Artists que iria editar o seu disco de estreia, “The Psychedelic Sounds of The13th Floor Elevators”. Este disco é hoje considerado um clássico, e contém “RollerCoaster” ou “Fire Engine”. O som “garage- psicadélico” que criaram assenta numa produção rudimentar que contrastava com o que era usual na altura, com vocalizações primárias, e imensas referências a experiências místicas e alucinações de drogas.
Problemas com a policia derivados pela divulgação e suporte do consumo de LSD e marijuana, que a banda propagava, fizeram com que os elementos que componham a secção rítmica saíssem da banda e já com uma nova formação iriam gravar o disco seguinte “Easter Everywhere”, editado em 1967, que apesar de manter o som hipnótico da banda, era mais elaborado. Contém grandes temas como “Earthquake” ou “I Had to Tell You”, para além de uma versão de “It´s All Over Now, Baby Blue” de Bob Dylan, e de “Slip Inside This House” popularizado na década de 90 pelos Primal Scream.
Novamente problemas relacionados com a droga, colocaram a polícia na rota da banda. E Roky acabou preso em 1969 por encontrarem na sua posse um cigarro de marijuana. Para evitar ir para a prisão, declarou insanidade mental. Como resultado passou três anos num hospital psiquiátrico, diagnosticado como esquizofrénico, e cujo ortodoxo tratamento era baseado em choques eléctricos e numa forte medicação.
Durante esses anos a editora lançaria dois discos (um ao vivo e outro com sobras de estúdio) mas que nada acrescentariam, e a banda acabou por se desfazer.
Quando Roky saiu do hospital, estava num estado mental lastimável. Ainda continuou a compor e chegou a editar alguns discos. Alguns nem interessa mencionar, outros apesar de serem bizarros exercícios, são brilhantes como o seu disco de 1980, “Roky Erickson & The Aliens”.
Em 1982, desapareceu sem rasto, tendo sido reencontrado na década de 90 a mendigar pelas ruas.
E partir daí alguns fãs célebres como os ZZ Top (também Texanos), R.E.M. ou Henry Rollins, começaram a citar o seu nome como uma influência. Muitos desses fãs reuniram-se e editaram um disco de tributo com versões de canções suas. E outros como King Coffey, convidaram Erickson a gravar novamente discos de originais.
Roky recuperou a alegria da vida, e hoje está a viver confortavelmente e com saúde, continuando a tocar esporadicamente.
Por tudo isto, é hoje uma figura de culto, um sobrevivente, que se tornou uma verdadeira lenda.

13 fevereiro 2008

Silje Nes - “Ames Room” (2007 Fat Cat)

A Fat Cat descobriu mais uma sublime e cativante artista.
Esta multi-instrumentista norueguesa decididamente vai buscar a sua inspiração criativa à dramática vastidão natural do seu país. As letras sugerem uma artista imersa no ambiente que a rodeia.
Ouçam as referências a lagos, sapos, e abelhas presentes no tema de abertura, “Over All”, que apesar de poderem sugerir um ambiente infantil, são complementadas por um instinto poético e um arrojado engenho musical.
A música de Silje combina um mundo de uma frágil beleza e intriga caleidoscópica. Existe uma apaixonante nostalgia presente neste “electro-folk”, que sustenta o espírito da experimentação.
Num momento ouvimos xilofones e guitarras acústicas, noutro temos resplandecente electrónica e manipulações de voz. Talvez pelo facto de ter demorado três anos a gravar este disco, seja evidente a presença de tantas influências diversas.
A esplêndida “Drown”, com uma guitarra assombrosa, desolada, o único acompanhamento de uma bela voz, melódica e dolorosamente frágil. “Bright Night Morning” é uma balada rústica, com Silje a aparentemente num estado de exaustão. “Ames Room” é uma canção de embalar “pop”, numa melodia delicadamente silenciosa (relembrou-me Stina Nordenstam), já “Giant Disguise” é um crescendo hipnótico.
Em “Ames Room”, Silje amplifica sons que são miniaturas, de uma forma que as canções parecem estoirar como meteoritos ao atingir o solo.

Silje Nes - Drown

11 fevereiro 2008

Kanye West and Daft Punk - Stronger (live @ Grammys 08)

Party time...

Classic # 12 - Portishead - “Dummy” (1994 Go! Discs)

Se Beth Gibbons e Geoff Barrow andavam a planear o que seria “Dummy” há mais de um ano, o guitarrista Adrian Utley andava a compor banda-sonoras privadas há muito mais tempo. E seriam as bandas-sonoras que os iria juntar, pois Barrow adorava “samplar” velhas bandas-sonoras para os seus sets de “dj”. E numa dessas sessões conheceu Utley, tendo-o convidado a partilhar e reforçar sonoramente o projecto que inicialmente resultava na partilha de outra das suas paixões – o “hip-hop” - que Barrow estendia sobre as paisagens sonoras criadas, com uma sedutora cadência, esmigalhadas pela delicadamente sombria voz de Gibbons.
“Dummy” é um disco intemporal, que alterna de tom, de dilacerantemente sombrio, até lamentável, até levemente optimista. Está encharcado em melancolia e depressão, ajustada à música. As canções são simples e evocativas, mas substanciais.
A tensa delicadeza de “Sour Times” (“nobody loves me, it’s true” - tornou-se numa das expressões da década), ainda hoje é relevante. E juntamente com “Numb”, “It Could Be Sweet” e “Glory Box”, foram declarados como fundadores de uma nova revolução sonora, denominada trip-hop.
O disco inclui outros destaques, como o espectral e relaxante “Mysterons”, o delicado “Roads” ou o agressivo “Wandering Star”. O disco arrasta o ouvinte para um abismo aveludado.
Os teclados Rhodes e o órgão Hammond são o núcleo do insinuantemente sublime som, adicionando um sentido épico à maioria das canções. Simultaneamente, os flexíveis acordes de guitarra e a percussão “jazzy” dão-lhe um ar terreno.
Muitos estilos musicais estão implícitos no disco (rock, soul, hip-hop, jazz, electrónica, música clássica), no entanto mantendo-o consistente e agonizantemente belo, e por isso mesmo, hoje a sua influência é tão notória e relevante.

08 fevereiro 2008

Extremos # 2 - The Ex – “Starters Alternators” (1998 Touch And Go)

Ao longo de mais de 25 anos de carreira, os The Ex raramente não foram exemplares na forma anárquica e explosiva que abordaram a música. Sempre procuraram novas formas de atormentar a música através das ferramentas base do “rock”: guitarras, baixo, bateria e vozes; com uma elasticidade suficiente para conter a fonte de vida que é o seu “noise”.
Eles praticam as suas autónomas crenças através de canções que colocam em primeiro plano todas as parcelas constituintes.
Aqui Steve Albini coreografa o caos de “Starters-Alternators” permitindo que o ruído não degenere em incoerência. Porque é um princípio e uma forma de orgulho para os The Ex desnaturar as vozes e desafinar os seus instrumentos, de forma que nenhum som brilhe ou seja ofuscada pelos outros. No mesmo espírito, as canções normalmente renunciam a lógica - versos, refrão, versos - por palavras lançadas de uma forma impetuosa e deturpada.
Estamos na presença de um som verdadeiramente glorioso quando se atinge o momento em todos os membros da banda colidem as suas ruidosas trajectórias de guitarras e percussão, e arremessam uma energia de cada um. Durante esses momentos culminantes eles conseguem ser tão excitantes como o foram os Sonic Youth nos anos 80.

06 fevereiro 2008

Bonnie “Prince” Billy - “Ask Forgiveness” (2007 Domino)

Quando não está empenhado em editar, sobre os seus vários pseudónimos, os magníficos álbuns que concebe, Will Oldham, ocupa os intervalos aventurando-se noutros projectos como o foram a colaboração com Matt Sweeney e o anterior disco de versões realizado a meias com os Tortoise.
Regressa agora com um mini-lp de versões, que poderá não ser tão diversificado como o realizado com os Tortoise, pois pode ser mais acessível, mas que não deixa de ter momentos sublimes, pois Oldham tem a habilidade de transformar praticamente tudo o que toca em pungentes canções “folk”, independentemente de as letras originais perderem toda a sua intenção inicial.
Com a ajuda de Meg Baird nas vozes e guitarra acústica, Greg Weeks na guitarra eléctrica (ambos são membros dos Espers) e ainda ocasionalmente por Maggie Wienk no violoncelo, cria uma cintilante combinação entre vozes e guitarras que circulam de um lado para o outro em perfeita harmonia, e que, no fim, fazem com que cada canção se torna sua.
Algumas interpretações são arrebatadoras, nomeadamente as menos improváveis e mais esperadas, como “World’s Greatest” de R. Kelly, ou “Am I Demon?” de Danzig, onde Oldham inverte a impudência ao fazer que a suposta “greatness” esteja ao alcance de qualquer um, na primeira, ou na forma como adopta o tom sombrio na segunda. Mas também o é a tocante e incrivelmente triste “I’ve Seen It All” de Björk, onde Oldham nunca tentar copiar ou imitar a mesma, sendo provavelmente por isso que esta e as restantes canções resultam tão bem. Ouçam como “My Life” de Phil Ochs ganha uma nova vida na melódica versão de Oldham.
Para além das versões inclui um grande original – “Loving The Street”.
São estes grandes momentos que tornam este disco merecedor de atenção.
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Ask Forgiveness

01 fevereiro 2008

Inovadores # 7 - Yellow Magic Orchestra

“Yellow Magic Orchestra” (1978 Alfa)
“Solid State Survivor” (1979 Alfa)
“Technodelic” (1981 Alfa)



Formados em 1978 pelo talentoso Ryuichi Sakamoto, pelo veterano Haruomi Hosono, e pelo percussionista Yukihiro Takahashi produziram onze discos, até ao seu término em 1984. Para mim, estes três são aqueles que melhor os representam.
Surgiram na altura da ascensão do Japão como inovador tecnológico, utilizaram sequenciadores, sintetizadores, samplers e caixas de ritmos, quando ainda eram regularmente a excepção
São frequentemente esquecidos quando se faz referência aos artistas que desbravaram caminho na evolução da música electrónica.
Criavam um divertido “techno-pop”, ou “twisted pop”, se preferirmos, mas onde nunca esconderam a sua paixão pelos Beatles (daí as versões).
Estes músicos já tinham assimilado todas as experiências primárias realizadas anteriormente com música electrónica, e deram um salto qualitativo para uma fase mais avançada, só que ainda não tinha sido inventado um tipo música para classifica-los. Pois ao contrário de uns frios Kraftwerk ou dos seus aprendizes britânicos como Gary Numan ou John Foxx, que tendiam perseverantemente para a ficção científica, os YMO ofereciam divertidas delicias “pop” totalmente descaradas.
Quando surgiu o disco homónimo de estreia, foram ignorados pela imprensa ocidental, que não se conseguir afastar da cacofonia criada pelos fortuitos ruídos electrónicos que abrem o disco. E assim não descobriu as esquadrilhas melódicas do psicadélico “Simoon” ou do irreflectido “disco-feel” de “La Femme Chinoise”.
Com “Solid State Survivor”, tentaram fugir do ecletismo presente no disco de estreia, e abordaram um som mais “mainstream”, mas nem por isso menos arrebatador. Desde o balouçante instrumental “Technopolis”, passando pelo belíssimo “Absolute Ego Dance”, ou pela sinuosa e pungente melodia de “Insomnia”, este disco está repleto de excelentes momentos.
Em “Technodelic” acontece mais uma reviravolta, criam um disco mais negro, cheio de vozes sinistras, ritmos incomodativos, percussões industriais destruidoras. “Epilogue” de Sakamoto, dá o mote, com uma melodia dilacerante.