31 janeiro 2007

Tributo # 2 David Eugene Edwards - 16 Horsepower - Woven Hand

As belas canções de David Eugene Edwards estão cheias de referências ao Antigo Testamento, e às suas histórias de pecado e redenção. O facto de ser neto de um pregador e um convicto Cristão, talvez ajudam a explicar o fascínio por esses demónios religiosos e o facto de ter criado, em 1992, os 16 Horsepower.
Originário de Denver, as suas canções são reminiscentes do tons góticos de Nick Cave e dos Gun Club, poemas do estirpe de Townes Van Zandt, baseadas num poderoso acompanhamento acústico, e aparições de banjos, bandolins e acordeões, que reforçam a natureza arcaica das letras de Edwards.
Gravaram o primeiro EP em 1995. E na sua obra destacam-se os discos “Low Estate” (1997) produzido por John Parish (colaborador de PJ Harvey), onde temas como “Brimstone Rock” e “For Heaven’s Sake” realçam a visão religiosa e litúrgica de Edwards, e “Folklore” (2002), que inclui grandes versões de “Single Girl” dos Carter Family e “Alone and Forsaken” de Hank Williams.
“Hoarse” de 2001 é um registo ao vivo de um concerto de 1998, que permite comprovar a intensidade que as canções de Edwards atingem em palco, e também interpretações surpreendentes como a versão de “Day of the Lords” dos Joy Division.
As últimas edições dos 16 Horsepower são a compilação de sessões e faixas ao vivo de 1993/94, que compõem “Olden” (2003), e os 2 DVD “16HP” (2005) e “Live” (2005), que incluem registos de actuações ao vivo (Bélgica, Alemanha, EUA) e documentários sobre a banda.
Desde 2002 activou o alter-ego Woven Hand, que ainda se aproxima mais da introspecção que caracteriza a acalmia sonora dos últimos anos de Nick Cave.
Mais ambiental e experimental que nos 16HP, o projecto não deixa de ser poderoso. Trabalhos como “Woden Hand” (2002), que inclui as belíssimas “The Good Hand” e “My Rússia”; “Consider the Birds (2004), o álbum mais negro que criou, ouçam o violino de “To Make a Ring” ou “Bleary Eyed Duty”; e “Mosaic” (2006), onde Edwards afastou-se das suas raízes americanas, e aproximou-se do som folk apocalíptico de bandas como os Current 93 e Death In June, inclui canções como “Breathing Bull”, “Whistling Girl” e “Alleluia que marcam o tom do disco.
“Mosaic” contém algumas das melhores composições de Edwards até à data (“Winter Shaker” com linha de baixo dos Joy Division é irresistível), e parece difícil imaginar qual será o seu próximo passo, sem voltar a pisar os mesmos caminhos, para um homem que já se reinventou tantas vezes.

29 janeiro 2007

Do fundo da prateleira # 1 - Pilote - "Do It Now Man" (2001 Certificate 18/Domino)

As novas tendências da música electrónica parecem estar a esquecer a pista de dança e a concentrarem-se no seu processo criativo.
O segundo disco de Pilote (Stuart Cullen, um DJ de Brighton) é um bom exemplo dessa tendência. Apesar de não ser o mais original dos discos, demonstra uma habilidade do artista em explorar novas áreas, apesar do suposto objectivo ser a pista de dança. O medo que Pilote diz ter das tecnologias, ajuda a explicar o processo simplicista da produção, que resulta num som retro. De facto, a primeira metade do disco, assente num ritmo "breakbeat" lento, apoiado em batidas pesadas dos sintetizadores e vozes fragementadas., dão um ar pesado e assustador ao disco. O melhor exemplo desta formula esta na faixa "The Dialogue" que "sampla" uma estranha conversa do filme "Trust" de Hal Hartley. A segunda parte do disco abandona o "breakbeat" a favor de um som de guitarrra na faixa "Beaulieu Road" (faz lembrar os Mum) ou um som mais funky em "Champion Waltz".
Assim quem pretender algo mais aventureiro, inovador, Pilote é um bom exemplo para começar.

26 janeiro 2007

Micah P. Hinson and the Opera Circuit (2006 Sketchbook)

Aproveitando a sua vinda a Portugal, e para quem ainda não conhece a sua obra, Micah canta histórias de tristeza, desespero e agonia, resultantes, no primeiro caso das suas próprias experiências; no segundo, devido a uma dependência de medicamentos, agravada nos últimos anos pela necessidade de aliviar as dores resultantes de um acidente que o deixou impossibilitado de andar.
“Micah P. Hinson and the Opera Circuit” de 2006 é o seu segundo disco, depois de “Micah P. Hinson and the Gospel of Progress” editado em 2004.
Enquanto que “…Gospel of Progress” é o resultado da sua vivência em Abilene, no Texas, e dos seus problemas com as drogas, que o levariam à prisão com apenas 19 anos. Erradamente este trabalho foi catalogado de “free-folk”, talvez pelo facto de ter partilhado os mesmos palcos com Devendra Banhart, que teve em 2005 o seu ano de consagração.
Já “…Opera Circuit” é um disco diferente, um reflexo da alegria e da esperança pelo facto de ter sobrevivido a tudo.
Poderosos arranjos de cordas fornecidos por Eric Bachmann, banjos e bandolins ruidosos, espirais de guitarras panorâmicas, acompanham a voz de Micah, triste e fatigada. Comparações com os Lambchop ou Josh Ritter, são evidentes, mas a combinação das suas histórias com o seu tom de voz faz-me lembrar os primeiros trabalhos de Tom Waits.
O lamento no seu melhor.

25 janeiro 2007

Tributo # 1 Anne Clark - ...Awaken in Metropolis

Na altura em que o punk surgiu, e que conduziu a uma nova aproximação na forma de encarar a música, as artes e a própria sociedade, Anne Clark trabalhava numa loja de discos, numa editora e organizava concertos com bandas que davam os primeiros passos como os Durutti Column.
Ao mesmo tempo, Clark, fazia as suas próprias experiências de composição que conduziram à estreia em disco no ano de 1982 com o album Sitting Room ". Mas foram as colaborações com David Harrow (James Hardway) e John Foxx (Ultravox), que marcariam o som que caracterizou Clark . As experiências com sintetizadores, sequenciadores e samples, permitiriam a criação de canções e texturas musicais que iriam providenciar muitas das pistas para a musica electrónica dos anos 80/90.
Discos com "Changing Places" (83), "Joined Up Writing" (84) e "Hopeless Cases" (87) com Harrow, e "Pressure Points" (85) com Foxx, representam o seu pico criativo, onde Clark , nunca colocou limites à sua expressão musical, explorando todos os estilos.
Nesse período surgiram clássicos como "Sleeper in Metropolis", "Our Darkness", "Heaven", "The Power Game" e "Wallies".
Essencial tornou-se o disco ao vivo "RSVP" gravado na Holanda, em 1987, que é uma celebração dessa fase e que inclui as melhores canções de Clark, que ainda se tornam mais belas no ambiente intimista que a sala de espectáculos proporciona.
A partir desta data, Clark mudou-se para a Noruega, e os seus trabalhos tornaram-se ainda mais experimentais, incorporando cada vez mais instrumentos acústicos. "To Be And To Be Love " (95) com a colaboração de Martyn Bates e Paul Downing, entre outros, é um bom exemplo desta ultima fase.
Neste últimos anos, muitos músicos e DJ's , criaram "remixes" das suas canções mais emblemáticas, como forma de tributo pela sua influência.

23 janeiro 2007

My Favorites # 1 - Big Audio Dynamite - No.10 Upping Street (CBS 1986)

Quando Mick Jones saiu dos The Clash, juntou-se ao famoso DJ e realizador Don Letts e formou os Big Audio Dynamite. O 1º disco “This Is Big Audio Dynamite” (85) foi uma progressão natural de temas dos Clash como “Inoculated City” de Combat Rock (o ultimo álbum em que participou Jones), que utilizou vários sons “samplados”. Mas com o seu 2º disco “No.10 Upping Street” de 1986, os B.A.D. criaram um dos discos mais brilhantes dessa época. Muitas faixas contam com a colaboração de Joe Strummer, que recriava a dupla que com Jones, foi responsável pelos grandes clássicos dos Clash. Desde os ritmados beats de “C’Mon Every Beatbox” e “Sightsee M.C.”, passando pelos mais melódicos “V. Thirteen” e “Hollywood Boulevard”, e os curiosos exercícios experimentais de “Sambadrome” (com samplers de um jogo da selecção Brasileira de futebol) e “Dial a Hitman” (que “sampla” um excerto do filme “Lafayette Zero Six”), o disco é uma boa amostra como um “punk-rocker” evoluiu de forma a integrar novas tendências e novas tecnologias.
Os discos seguintes “Tighten Up” (88) e “Megatop Phoenix” (89), sem serem brilhantes, ainda são curiosos. Mas as reincarnações primeiro como B.A.D. II e posteriormente como Big Áudio são pouco recomendáveis.

The Young Knives - "Voices Of Animals And Men" (2006 Transgressive)

O disco de estreia deste trio de Oxford é mais um produto que reflecte a admiração que a geração actual mantém sobre o período pós-punk (facto reforçado com a presença de Andy Gill dos Gang Of Four no papel de Produtor), só que o mesmo é realizado de uma forma muito inteligente. Neste caso, o melhor é mesmo ouvir. A ironia constante que caracteriza o disco (principalmente nas referências aos conflitos laborais e familiares), é bem diluída na delicadeza melódica que percorre as canções. Desde as influências folk de "The Decision" e "In the Pink", até à brutalmente repetitiva "She's Attracted To" e ao desesperado lamento cultural que "Weekends and Bleak Days Hot Summer" transmite.
Definitivamente canções fora da norma.

19 janeiro 2007

Camera Obscura - "Let's Get Out Of This Country" (2006 Merge)

"Are You Ready To Be Heartbroken?", perguntava Lloyd Cole em 1984. A resposta chega 22 anos depois, "Lloyd, I'm Ready To Be Heartbroken", canção de apresentação dos escoceses Camera Obscura, presente no seu terceiro disco "Let´s Get Out Of This Country", gravado na Suécia com o produtor Jari Haapalainen (já trabalhou com Ed Harcourt).
E a ligação pode ser encontrada na pop melódica, de cariz romântica. Estamos presente 10 canções com uma beleza orquestral notavel, apoiada nos excelentes arranjos da secção de cordas, e no clássico som do orgão sempre presentes. Canções como "Come Back Margaret", "If Looks Could Kill", ou "Dory Previn" (dedicado à cantora americana dos anos 70, que parece servir de inspiração para a vocalista Tracyanne Campbell). Outras influências que podem servir para entender o charme desta banda de Glasgow, que apesar de se ter formado em 1993, só editou o primeiro album em 2001, são as girls-band da Motown dos anos 60 (Supremes, etc), os Velvet Underground, e os The Pastels.
Recomendado aos fãs dos antigos Belle & Sebastian (expecialmente os que ficaram desiludidos com "The Life Pursuit".