29 março 2011

Rock # 21 - June Of 44 – “Four Great Points” (1998 Quarterstick)

Composta por membros ou ex-membros de algumas das mais intrigantes bandas do “underground” americano da última década (Codeine, Rodan, Hoover e Rex), os June Of 44 retiram influências idênticas desses grupos para uma angular, forte e muitas vezes confusa sonoridade que se revela verdadeiramente em casa na editora de Chicago, Quarterstick Records. “Four Great Points” poderá ser considerada a gravação mais acessível da banda, mas também mostra que eles não perderam nenhum do seu carácter aventureiro. Ao manterem as músicas um pouco mais curtas do que as peças épicas que costumavam criar, eles produziram um álbum muito coerente e fluido. Eles surgem aqui como uma versão 4base e desarticulada do “math-rock” “pós-hardcore” dos Slint, mas mais melódicos, com uma instrumentação estelar, suave e indolente, no entanto brilhante e luminosa, que muito beneficia da experiencia em estúdio dos músicos, seja a realmente impressionante bateria de Doug Scharin, sejam as grandiosas linhas de baixo de Fred Erskine. Este “belo ruído” pode intimidar nas primeiras audições, pois as músicas são muito repetitivas, mas eles são suficientemente criativos para modificarem subtilmente o ambiente sonoro das canções enquanto estas progridem. E seja o incrível tema de abertura, “Of Information and Belief”, uma poética e surreal canção que tem os seus momentos de caos presos no seu interior, sejam as súbitas mudanças ao longo da canção de “The Dexterity Of Luck” e “Cut Your Face”, ou sejam as mais ritmicamente fluidas “Doomsday” e “Lifted Bells”, estamos na perante um disco recheado do mais delicioso “math-rock”.

15 março 2011

Pop # 17 - Pale Saints - “The Comforts of Madness” (1990 4AD)

No seu disco de estreia, os Pale Saints, conseguiram misturar o lado mais experimental e atonal do “indie rock” com uma pureza melódica, numa época onde a fusão entre o “dream pop” e um gentil “shoegaze” era bastante comum, mas que poucos o fizeram como eles e essa associação ainda continua única nos nossos dias.
Aqui estamos presente uma matéria-prima energética aliviada por uma pureza pacífica.
Com uma personalidade muito própria, ao invés de apenas criarem um som abafado e atropelado por cascatas de guitarras, deram-nos canções muito elaboradas na sua estrutura, extremamente aconchegantes e onde se nota é visível um verdadeiro esforço em serem algo mais do que apenas uma banda com uma sonoridade etérea. E se é verdade que no espectro do “shoegaze”, os Pale Saints (que sempre pareceram criminalmente sob considerados) estão mais próximos de uns Cocteau Twins - com excepção dos gloriosos sintetizadores que são substituídos por um formato sonoro mais “rock” - existe definitivamente uma sensação “4AD”, mas também há algo verdadeiramente único neste registo.
Assim desde a primeira faixa, “Way The World Is”, eles não parecem seguir uma fórmula, e cada faixa segue para a próxima sem lacunas, pois eles possuem um verdadeiro ouvido para uma musicalidade progressista, e preenchem os espaços muito bem, executando mudanças dentro das canções com uma magistral precisão.
Existe um absoluto equilíbrio entre a excentricidade e a formalidade da estrutura “pop” ao longo do álbum, e em canções como “Little Hammer”, aventuraram-se numa direcção onde provavelmente nenhum dos seus contemporâneos nunca tentaria.
A combinação entre voz incrivelmente doce, misteriosa e assustadora de Ian Masters com o harmonioso trabalho de guitarra produzido por Graeme Naysmith deixou-nos pequenas maravilhas como “Sea of Sound”, “Insubstantial”, “Language of Flowers” ou “Sight of You” que nos guiam numa belíssima e transcendental viagem.
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02 março 2011

Wire – “Red Barked Tree” (2011 Pink Flag)

Ao longo da sua carreira de 35 anos, os Wire sempre se basearam em contrariedades, eles eram suaves e limpos, e rigidamente experimentais numa época em que o “punk” não era nadas dessas coisas. Eles sempre intensificaram os princípios da disciplina formal da arte musical (eles que poderiam ter abandonado após os seus álbuns de 1977-79, e o seu lugar na história já teria sido salvaguardado) e ao longo dos anos foram mergulhando em muitos mares do mais inteligente “indie-rock” – “electro”, “pop-art”, “shoegazing” – e apesar de ser muito mais um álbum de guitarra, “Red Barked Tree”, sente-se como uma amálgama da sua curiosidade. Retomando a partir de onde “Object 47” (2008) tinha terminado, o angular “Red Barked Tree” é um álbum sem remorsos, onde encontramos os Wire a revisitar o seu passado de uma forma simultaneamente familiar e diferente. Aqui temos os Wire antigos e os Wire modernos. “Red Barked Tree” ergue-se à altura da trilogia original melhor que qualquer álbum desde o sinistro “A Bell Is A Cup Until It Is Struck” (1988), e eles parecem francamente entusiasmados, seja na desajeitada e carregada guitarra de “Please Take”, na bombástica e dinâmica “Now Was”, na contemplativa “Adapt”, no forte choque de confrontação presente em “Two Minutes”, nas quentes guitarras “indie” de “Bad Worn Thing”, no excitante e angular “art-pop” de “A Flat Tent”, ou na mistura entre rodopiante e espinhosa guitarra “noise” com a perfeita melodia “pop” realizada em “Smash”, criando 11 faixas de ritmos enganosamente simples, de cintilante instrumentação e com um inabalável propósito que arrasta a sua “antiga” sonoridade para novos domínios.
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